Princesa Isabel marcante personagem na História do Brasil


16/05/2006

Dom Luiz de Orleans e Bragança

Para o “fecho de ouro” da seção Grandes Personagens, solicitamos a Dom Luiz, Chefe da Casa Imperial do Brasil, um artigo sobre sua ilustre bisavó, a Princesa Isabel, uma grande dama brasileira, fervorosa católica, que assumiu em sua época admiráveis posições


É com muito gosto que atendo ao pedido de Catolicismo de escrever algo sobre minha bisavó, a Princesa Isabel. Máxime porque, embora seja venerada no Brasil como a Redentora da raça negra, sua personalidade total não é geralmente conhecida. Dou aqui alguns traços, a fim de contribuir para esse conhecimento. Pouco se sabe, por exemplo, sobre seu vulto de grande dama, sua bondade bem brasileira e seu inalterável amor ao Brasil.

A Princesa Isabel era filha de D. Pedro II e de Da. Teresa Cristina Maria de Bourbon, das Duas Sicílias. Desse matrimônio nasceram quatro filhos –– um varão, duas mulheres e mais um varão. Os filhos homens morreram cedo, e portanto às filhas, Da. Isabel e Da. Leopoldina, transmitiu-se diretamente o direito à sucessão ao trono.

Isabel, a mais velha, nasceu em 20 de julho de 1848, batizada a 15 de novembro do mesmo ano com o nome de Isabel Cristina Leopoldina Augusta Micaela Rafaela Gonzaga, na capela imperial, pelo Bispo Conde de Irajá. Padrinhos por procuração: D. Fernando, rei de Portugal, e a rainha Maria Isabela, viúva de Francisco I das Duas Sicílias, sogra de D. Pedro II. Conta o livro de Hermes Vieira: “Antes do batismo, na escadaria da capela imperial, o Imperador, aproximando-se da filha e tomando-a nos braços, avançou um passo e a apresentou ao povo, que lá fora, curioso, comprimido, correspondeu ao gesto do monarca ovacionando Sua Alteza e aos soberanos do Brasil. Ouviram-se então os sons heróicos do Hino Nacional, confundidos com o vozerio consagratício da multidão, entoados pelas bandas de música postadas no passadiço e no coreto armado junto ao alpendre da torre da capela imperial”.(1)

Uma princesa profundamente católica


A última fotografia da Família Imperial em Petrópolis, antes da proclamação da República

Da. Teresa Cristina, nossa terceira imperatriz, pertencia à Casa de Nápoles, que é profundamente católica. Esta esmerou-se sempre na aliança com o Papado, na defesa da Igreja. Por ocasião do chamado Risorgimento italiano (isto é, a unificação da península), a Casa de Nápoles perdeu seu trono porque não quis usurpar os Estados de outros soberanos, principalmente os Estados Pontifícios. Isto ocorreu em 1860, dez anos antes da queda de Roma, invadida pelas tropas garibaldinas. Garibaldi e a Casa de Sabóia concentraram todas as suas forças contra Nápoles, e só depois foram atacar os Estados Pontifícios. Da. Teresa Cristina recebeu e transmitiu arraigada formação católica à sua filha Isabel.

A Princesa Isabel realmente foi católica do fundo da alma até o fim da vida. Aos quatro anos, foi reconhecida solenemente como herdeira presuntiva do trono, e com 14 anos prestou o juramento de estilo perante as duas Câmaras da Assembléia. Em 1864 casou-se com o conde d’Eu, como resultado de um fato pitoresco e até comovedor. D. Pedro II procurava noivos para suas duas filhas, as princesas Isabel e Leopoldina, e pediu à sua irmã Da. Francisca, casada com o príncipe francês de Joinville — daí o nome de nossa cidade em Santa Catarina — que procurasse para suas sobrinhas dois noivos apropriados, entre as Casas reais européias. Atendendo ao pedido, a Princesa de Joinville encontrou dois primos irmãos: o Duque de Saxe e o Conde d’Eu, este príncipe da Casa de Orleans, portanto muito proximamente aparentado com o marido dela. O Duque de Saxe estava destinado à Princesa Isabel e o Conde d’Eu a Da. Leopoldina. Mas, chegando aqui, os noivos viram que não combinavam, e resolveram trocar. A Princesa Isabel escreve, com muito charme: “Deus e nossos corações decidiram de outra maneira”. O Conde d’Eu se casou então com a Princesa Isabel, e Da. Leopoldina com o Duque de Saxe. Hermes Vieira afirma: “o Conde d’Eu se sentia bem ao lado dela. Era simples, boa, afetuosa e pura. Possuía uma voz bem educada e tocava piano com sentimento e graça. Tinha uma sadia ingenuidade, uma singeleza de idéias, quer dizer, uma clareza de idéias admirável, além de muita sensibilidade. Isso, sem falar dos seus talentos, da sua instrução pouco comum para a época. Dominava corretamente o francês, o alemão e o inglês”.(2) Formaram até o fim da vida um casal unidíssimo.

Por ser de convicções firmes, a princesa era difamada


A Princesa Isabel e o Conde d’Eu com seus três filhos

Logo que a Princesa Isabel se estabeleceu com casa própria — no hoje palácio Guanabara, que era o palácio Isabel da época — procurou, em seu papel de princesa herdeira mas não regente, fomentar uma vida cultural e social no Rio de Janeiro. Promovia então toda semana um serão e um jantar, mais elegante ou menos, mais cultural ou menos. Isso para fomentar a cultura geral na Corte. Esses serões eram muito concorridos. O próprio Imperador ia uma vez por semana à casa da filha para jantar.

Em 1871, por motivo da viagem do casal imperial, Isabel prestou juramento como Regente do Império perante as duas Câmaras. “Juro manter a Religião Católica Apostólica Romana, a integridade e indivisibilidade do Império, observar e fazer observar a Constituição política da Nação Brasileira e mais leis do Império, e prover o bem do Brasil quanto a mim couber. Juro fidelidade ao Imperador e entregar-lhe o governo logo que cessar o seu impedimento”.

Nesse mesmo ano, a 27 de setembro, sendo presidente do Conselho o visconde do Rio Branco, pai do barão do Rio Branco, foi votada a Lei do Ventre Livre, na sessão que ficou chamada Sessão das Flores. Quando foi aprovada a Lei do Ventre Livre, uma chuva de rosas desatou-se no plenário da Assembléia. O ministro dos Estados Unidos no Rio de Janeiro, Mr. Partrige, colheu algumas dessas flores, e disse: “Vou mandar estas flores para meu país, para mostrar como aqui se fez uma lei que lá custou tanto sangue”. A Guerra de Secessão nos Estados Unidos custara 600 mil mortos...

Em 1876, na segunda regência, começou uma campanha de detração promovida pelos círculos republicanos, positivistas e anticlericais contra a Princesa Isabel, por causa de seu catolicismo. Tais círculos viam que ela — por sua firmeza de princípios, por sua formação profundamente católica, mas também pelo pulso que demonstrou nas regências — seria uma imperatriz que faria da Terra de Santa Cruz realmente uma bela exceção no mundo. Ela exerceria uma profunda influência por sua autenticidade, sua cultura, sua religiosidade, e por tudo aquilo que pode elevar o espírito de um povo. Isso os referidos círculos não desejavam de nenhum modo. Começaram então a campanha de detração: ela era feia; era carola; era boba; não era patriota; não gostava do Brasil; preferia ter médicos franceses a brasileiros, e outras calúnias. O Conde d’Eu, que sofria de surdez, era chamado de surdão, arrogante, e mantinha cortiços de aluguel. Até a surdez — da qual ele evidentemente não tinha culpa — era assacada em meio às calúnias. De tal maneira que, pouco a pouco, esse casal foi sendo demonizado, para se evitar que mais tarde ele subisse ao trono. Dizia-se, em certos círculos, que era preciso proclamar a república logo, porque se a Princesa Isabel assumisse o poder, acabaria com todo esse movimento ateu, positivista e republicano. Ela teria pulso e prestígio para fazer isso. Tornou-se corrente a frase: “Precisamos fazer a república enquanto o velho está vivo, senão a filha dará cabo de nós”.

A Princesa Redentora da raça negra

Em 1888 a Princesa Isabel, sendo novamente regente, assinou a Lei Áurea. Tendo provocado a queda do gabinete Cotegipe, a Princesa chamara o Conselheiro João Alfredo Corrêa de Oliveira, que era abolicionista, à presidência do Conselho. Este fizera votar a Lei Áurea e a apresentara para a assinatura da Princesa Isabel. O Conde d’Eu, nessa ocasião, teve um momento de hesitação : “Não o assine, Isabel. É o fim da monarquia”. Ao que ela respondeu: “Assiná-lo-ei, Gaston. Se agora não o fizer, talvez nunca mais tenhamos uma oportunidade tão propícia. O negro precisa de liberdade, assim como eu necessito satisfazer ao nosso Papa e nivelar o Brasil, moral e socialmente, aos demais países civilizados”.(3)

Depois da assinatura realizou-se grande festa no Rio de Janeiro, com grandes aclamações do povo. Estando a Princesa Isabel junto ao barão de Cotegipe na janela do palácio — o barão a estimava, embora estivessem em desacordo na questão da escravidão — ela perguntou-lhe: “Então, Senhor barão, V. Excia. acha que foi acertada a adoção da lei que acabo de assinar?”. Ao que o barão, com muito carinho, respondeu: “Redimistes, sim, Alteza, uma raça, mas perdestes vosso trono...”(4)

D. Pedro II nesse momento estava em Milão, muito doente e com a perspectiva iminente de morte. Mas a 22 de maio ele sentiu certa melhora, e a Imperatriz teve a coragem de lhe dar a notícia da Abolição. Diz Heitor Lyra: “Enchendo-se de coragem, debruçada sobre a cabeceira do marido, deu-lhe com brandura a grande nova. O Imperador abriu lentamente os olhos emaciados e depois perguntou como quem ressuscitava: ‘Não há mais escravos no Brasil?’. ‘Não – respondeu a Imperatriz – a lei foi votada no dia 13. A escravidão está abolida’. ‘Demos graças a Deus. Telegrafe imediatamente a Isabel enviando-lhe minha bênção e todos os agradecimentos para o País’. Houve um momento de silêncio. A emoção dos presentes era grande. Virando-se lentamente, o Imperador acrescentou, numa voz quase sumida: ‘Oh! Grande povo! Grande Povo!’ O telegrama que foi mandado à Princesa Isabel tinha o seguinte teor: ‘Princesa Imperial. Grande satisfação para meu coração e graças a Deus pela abolição da escravidão. Felicitação para vós e todos os brasileiros. Pedro e Tereza’”.(5)

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