Uma falácia


06/12/2004

Brasília, segunda-feira, 06 de dezembro de 2004

Bertrand de Orleans e Bragança

Poucos temas me deixam tão à vontade para abordá-los como o do chamado trabalho escravo. Realmente, conservo viva em meu coração e em minha alma a alegria de ser bisneto da princesa Isabel, que ficou conhecida no Brasil como a Redentora por ter assinado a famosa Lei Áurea.
E ela o fez em situação política muito adversa, arriscando com isso a própria estabilidade do trono do qual era herdeira, o que evidencia por si só seu empenho superlativo em dar pronta liberdade àqueles que não a possuíam.

De modo que, se houvesse no Brasil de hoje um risco real de voltarmos à vigência da escravidão, eu me sentiria obrigado em consciência, como católico, como brasileiro, mas também como membro da família imperial, a empreender tudo quanto ao meu alcance estivesse para evitá-lo.

É por isso, aliás, que vejo com tristeza, dor e mesmo indignação certas práticas que se generalizam nos assentamentos de reforma agrária, em que agricultores pobres vão sendo colocados sob autoridade omnímoda de líderes do MST, tornando-se em tudo deles dependentes, inclusive no que diz respeito a verbas, cestas básicas e outras benesses fornecidos pelo governo federal. São os novos servos da gleba do século 21.

Mas, infelizmente, não é a favor da libertação deles que ecoam os alto-falantes de certa mídia e de certos políticos quando propagam a idéia de que uma neo-escravidão estaria encontrando guarida nos campos brasileiros.

O slogan ‘‘trabalho escravo’’ tem sido utilizado para rotular meras infrações à legislação trabalhista, ou quando muito trabalho realizado em condições impróprias ou degradantes, já puníveis pelos códigos competentes. Até a falta de carteira assinada é apontada como fator que caracteriza a escravidão, sem atentar para o ridículo de tal classificação num país como o nosso, em que 58% do trabalho é realizado na informalidade.

O tema é vasto e vem desenvolvido no opúsculo Trabalho escravo, nova arma contra a propriedade privada, do jornalista Nelson Barretto.

Desejo aqui pronunciar-me apenas sobre um ponto: o projeto de emenda constitucional (PEC) que, sobre o assunto, tramita na Câmara e pune a exploração do trabalho escravo com pena de expropriação, sem indenização. Pune a quem? A redação da PEC estranhamente confunde a propriedade com a pessoa que estaria cometendo o pretenso crime de escravidão. É tal a aversão que transparece no projeto à propriedade que esta parece ser a ‘‘criminosa’’, em lugar do proprietário. Diz o texto: ‘‘As propriedades (...) onde for localizada (...) a exploração de trabalho escravo serão expropriadas’’.

O destino da terra assim expropriada é servir à malfadada reforma agrária. Por que misturar trabalho escravo com reforma agrária? Para conseguir terra de graça? É moral tal atitude? É própria de um regime de liberdade?

Ao que parece influi decisivamente o fato de não haver mais terras improdutivas em mãos de particulares. Só não produzem as que estão sob domínio do Estado, a qualquer título, como as reservas florestais, os latifúndios indígenas, os parques nacionais e... os assentamentos do Incra. Mas então a reforma agrária é feita contra a propriedade particular?

Acresce a essas considerações o fato de que a produção obtida pelo agronegócio é espetacular e vem sendo o esteio da economia nacional. Uma perseguição à propriedade particular a pretexto de trabalho escravo ou qualquer outro poderia afetar a fundo a produção nacional, encaminhando o país nas sendas de um miserabilismo de tipo cubano, tão amado dos D. Balduínos e seus companheiros da Comissão Pastoral da Terra (CPT).

Não só a CPT, mas também o MST, na coerência de sua inspiração marxista, têm sido os arautos da luta contra o agronegócio no Brasil. Tais movimentos ficariam entusiasmadíssimos com o governo atual caso este iniciasse um combate ao trabalho escravo que redundasse numa perseguição ao agronegócio.

Meras elucubrações ou realidade em andamento? De qualquer modo, o pensamento político (com P maiúsculo, não-partidário), faz-se muito de levantar hipóteses. Já o dizia o saudoso professor Plinio Corrêa de Oliveira. Os fatos confirmarão ou desmentirão essas hipóteses. Fiquemos atentos

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