O caso da freira assassinada no Pará


18/02/2005

Os acontecimentos que redundaram na morte da freira norte-americana Doroty Stang no Pará continuam confusos.

Pessoas que estavam com a freira dizem que ela foi executada. A polícia tem uma lista de suspeitos.

Já o diretor do Núcleo da Transamazônica do Sindicorte (Sindicato Paraense de Pecuária de Corte), Francisco Alberto de Castro disse que a imprensa vem noticiando "inverdades". Segundo ele, a morte não foi programada, mas um crime isolado e acidental. "O grupo dela [da freira] teria queimado uma camionete e as pessoas ligadas ao dono foram saber o que acontecia. Ela, então, disse: "Aqui vai ser desse jeito mesmo". Começaram a discutir. Aí o cara, no calor da discussão, atirou nela."

“Agitadora”

Para ele, a missionária Dorothy Stang é a "culpada" pelo conflito na área rural que resultou no assassinato dela, no último sábado. "Estão fazendo dela uma santa e ela não é. Ela criou uma situação que levou ao que aconteceu. Ela é culpada disso." O fazendeiro disse que a freira mandava invadir terras e criava transtorno em Anapu (PA). "Era uma agitadora, uma mulher que criou só problema e agora é endeusada de maneira que está prejudicando a região, porque o governo está mandando tropas e criando uma confusão."

Informou que a Câmara de Anapu declarou, em 30 de abril de 2003, a missionária "persona non grata", "como ato de repúdio da população às ações desagregadoras por ela praticadas". Castro disse que "95% da população" de Anapu é contra a freira.

Governo não quer desapontar o MST

O jornal Folha de S. Paulo (18-2) informa que o governo está preocupado com a reação das entidades, especialmente dos sem-terra. Marina Silva (Meio Ambiente) afirmou que era preciso sinalizar para os aliados antigos do PT, como o MST, que o governo agirá.

O governo federal decidiu interditar 8,2 milhões de hectares de área pública na margem esquerda da BR-163, na região Norte - o que equivale a quase o dobro do Estado do Rio de Janeiro - para nelas criar, dependendo de estudos específicos, mais unidades de conservação ambiental. Essa foi a região onde ocorreu o maior número de desmatamentos em 2004. Com essa determinação, pretendemos bloquear a expansão dessa frente predatória no sul do Pará", explicou a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. O governo anunciou também outras sete medidas preparadas pelo Meio Ambiente, incluindo mais cinco decretos, uma medida provisória e um projeto de lei que criará a gestão de florestas públicas, incluindo a formação de um Serviço Florestal Brasileiro e o Fundo Nacional de Desenvolvimento Sustentável.

Imediatamente, o governo já criou cinco unidades de conservação, duas delas nas áreas de conflito no Pará. A primeira é a estação ecológica de Terra do Meio, com 3,4 milhões de hectares. A outra, o Parque Nacional da Serra do Pardo, entre Altamira e São Félix do Xingu, com 445 mil hectares. Em ambas, a exploração será limitada a um plano de manejo ambiental.

O governo federal montou uma operação de guerra na selva para capturar os quatro suspeitos do assassinato da irmã Dorothy Stang. o Exército mandou para o local três helicópteros com capacidade para transportar 23 pessoas cada e equipamento sofisticado de operações de selva, que inclui aparelhos de comunicação por satélite Globalsat, além de veículos de deslocamento em terrenos acidentados. Eles trouxeram até cães de guerra, além de armamento pesado de combate, que inclui fuzis, metralhadoras e granadas. nos próximos dias 400 policiais da Força Nacional para a região do conflito de terras no Pará.

Governo autoritário

Os sindicatos dos pecuaristas e dos madeireiros do Pará divulgaram hoje uma nota conjunta classificando "de ardilosas e oportunisticamente associadas a recentes atos de violência no campo" as medidas anunciadas quinta-feira pelo governo federal para a região Norte. Eles manifestam "inconformismo diante da maneira rude e autoritária" com que o governo federal trata a violência e a questão fundiária na região.

Na opinião dos sindicatos Paraense de Pecuária de Corte (Sindicorte) a Indústria Madeireira do Baixo e Médio Xingu (Simbax), o pacote de medidas "interdita o desenvolvimento em nome de uma política de preservação anti-econômica, anti-social e antidemocrática". Eles ressaltam que a morte da irmã Dorothy Stang não pode servir de pretexto "para cercear a atividade de empreendedores que, há mais de 30 anos, se instalaram na Transamazônica atendendo a um apelo do governo federal para um projeto de desenvolvimento regional".

Os sem-terra mandam na região

Aqui os sem-terra são inimputáveis, igual a índio", protesta Lázaro de Deus Vieira Neto, o Lazinho, presidente do Sindicato dos Produtores Rurais de Parauapebas. Ele reclamou que dezenas de mandados judiciais para reintegração de posse não são cumpridos pelo governo paraense. "O governo virou refém dos sem-terra".

Muita gente pensa que o fazendeiro é quem manda na região, mas são os sem-terra que mandam", afirma. "Estamos sofrendo demais, geramos emprego, produzimos, trabalhamos e não temos sossego."

As estradas interditadas pelos sem-terra impedem o escoamento da produção da mina Sossego, a maior produtora de cobre do Brasil, explorada pela Companhia Vale do Rio Doce. Caminhões parados ao longo da estrada esperavam ontem pela liberação. Um caminhoneiro que tentava ir para Marabá matava o tempo no bar A Gaúcha, centro de Parauapebas. "Tinha de matar todos esses bandidos aí" (FSP, 18-2).

Esquerda católica e ambientalistas

A organização ambientalista Greenpeace iniciou uma campanha internacional para pressionar o governo a prender e punir os assassinos da irmã Dorothy Stang.

Editorial do jornal O Estado de S. Paulo (18-2) comentar: “A óbvia tentativa de tornar a irmã Dorothy Stang mártir da violência entre latifundiários improdutivos e miseráveis trabalhadores rurais sem-terra, feita por um alto dignitário da Igreja Católica no Brasil, viola uma das virtudes cristãs fundamentais: o amor à verdade. A verdade é que nem o agronegócio, nem muito menos o MST, tem o mínimo interesse pelas terras cobertas pela floresta amazônica. O que o MST deseja são as terras cultivadas pelos "agronegociantes" - de preferência em São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul. Dom Tomás Balduíno age como os fariseus execrados por Cristo”.

Do contingente da esquerda católica que atua no Pará e em Tocantins, destacam-se o frade dominicano francês Henri Burin des Roziers, o ex-seminarista José Batista Gonçalves Afonso, o frade dominicano Xavier Plassat, que também coordena atuações da Comissão Pastoral da Terra (CPT).

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