Iniciou-se
ontem o conclave que elegerá o novo papa. Não pretendo entrar no frenesi
eleitoreiro que certas personalidades e setores da mídia desencadearam.
Esquecem os fatores sobrenaturais que envolvem a escolha de um romano
pontífice, cujos ensinamentos o divino fundador da igreja quis infalíveis, em
matérias e condições específicas. É, pois, primordialmente na prece contínua,
confiante e submissa que devemos seguir os acontecimentos.
Creio, entretanto, legítimo
tecer algumas considerações em torno da sucessão de João Paulo 2º, ante cujos
restos mortais, como príncipe católico, inclino-me
aqui com o devido respeito.
Estará o novo Papa
determinado a desvendar as articulações da esquerda católica?
A veneração e filial
confiança pela cátedra de Pedro e por seu imortal ocupante, manifestada pelas
multidões que acorreram a Roma, foram de tal monta que os meios de comunicação
modernos -na sua quase esmagadora maioria laicos e aconfessionais- viram-se impelidos a dispor de seus ousados
recursos técnicos para dar cobertura aos eventos. A existência dessa opinião
pública que, avessa às ofensivas publicitárias, reconhece nos papas
figuras-chave na determinação dos rumos da humanidade significa uma vitória da
santa igreja e do papado.
Não exprimirão tais
manifestações alguma tendência profunda a ser levada em consideração pelo
futuro papa?
Só um desavisado não
percebe que as correntes mais afoitas do progressismo católico (tanto no plano teológico, filosófico
e moral quanto no plano social e econômico), confinadas, em maior ou menor
medida, no pontificado que agora cessa, parecem agitar-se esperançosas de um
alento vindo do alto.
Hoje a realidade da
civilização cristã vai se desvanecendo e cedendo o passo a um laicismo de
Estado, mais agressivo no ataque aos mandamentos, aos princípios morais da
santa igreja e da ordem natural. Fará o novo papa com que a igreja se abra
ainda mais ao mundo moderno, relativizando-lhe os
dogmas? Deixará de dar respostas "antigas" a problemas novos? Ou,
pelo contrário, proclamará as verdades eternas, as únicas realmente salvíficas? São perguntas que intrigam muitos católicos.
Especula-se que o próximo
papa possa vir da América do Sul e, quiçá, de nosso Brasil. A se dar essa
eventualidade, é forçoso reconhecer que os problemas que aqui afligem a igreja
passariam a estar em destaque.
Influenciada em graus
diversos pela Teologia da Libertação, a "esquerda católica",
distorcendo a realidade socioeconômica, investe contra as chamadas
"estruturas injustas", visando impor um regime socioeconômico, pseudo-evangélico,
miserabilista, de uma economia primitiva e
comunitária, em que a propriedade privada deixe de existir. A famigerada
reforma agrária socialista é disso um exemplo gritante!
Estará o novo papa
determinado a desvendar as articulações dessa "esquerda católica", a
denunciar-lhe as falsas doutrinas? Ou terá para com ela simpatias mais ou menos
confessadas e lhe apoiará os anseios?
Mil outros problemas se
colocarão diante do novo pontífice, tão díspares como a disciplina eclesiástica
ou a relação da igreja com o islã. Em todos eles se verá diante de um dilema
crucial: enfrentar com argúcia e firmeza as ameaças que de fora e de dentro da
igreja tentam debilitá-la e subjugá-la, ou entabular com elas um diálogo, uma
aproximação ou até mesmo uma cômoda colaboração?
Dias antes da eleição de
João Paulo 1º, escreveu Plinio Corrêa de Oliveira,
nas páginas deste prestigioso jornal, o artigo "Clareza". Pela
atualidade com que traça dilema similar, faço minhas as suas palavras:
" Como vê cada um dos "papabili" as correntes rumo às quais esses movimentos
de aproximação os convidam? Como hidras que é preciso abater desde logo com o
gládio de fogo do espírito? Como adversárias inteligentes, dúcteis e talvez um
pouco bobas, com as quais é possível conduzir lentas, cômodas e quiçá até
cordiais negociações? Como parceiras, em uma coexistência ou mesmo colaboração
perfeitamente aceitável, e por alguns lados até simpática? Classifico-me, todos
o sabem, entre os que exultariam com a escolha de um papa combativo como São
Gregório 7º ou São Pio 10º. Outros preferem nitidamente um papa aproximacionista, como foi em seu tempo Pio 7º.
Mas a imensa maioria dos fiéis, o que desejará ela?"
Recordo as imagens da praça São Pedro, enquanto João Paulo 2º agonizava. Milhares
de fiéis rezavam o terço e entoavam o hino de Fátima. Sinal de que, para
muitos, no momento em que a igreja imerge numa incógnita crucial, a mensagem de
Fátima, com suas advertências e promessas, continua a ser -a meu ver, cada dia
mais- um precioso farol a iluminar os passos dos que têm fé. Para todos reboa, plena de esperança, a promessa da virgem: "Por
fim o meu imaculado coração triunfará!".
--------------------------------------------------------------------------------
Bertrand de Orleans e Bragança, 64, é trineto do imperador dom Pedro 1º
@ - dombertrand@terra.com.br