As grandes perspectivas de Fátima: o castigo, a conversão e o Reino de Maria
18/05/2005
Plinio Corrêa de Oliveira
Explicação
e remédio da crise contemporânea
Os fatos
contemporâneos mais marcantes são:
A segunda guerra mundial
superou a primeira do ponto de vista da duração, da universalidade,
da mortandade e das ruinas que ocasionou
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1) A crise universal. A sociedade humana apresentava na primeira
parte deste século, isto é, até 1914, um aspecto brilhante. O progresso
era indiscutível em todos os terrenos. A vida econômica tinha alcançado
uma prosperidade sem precedentes. A vida social era fácil e atraente.
A humanidade parecia caminhar para a era de ouro. Alguns sintomas graves
destoavam das cores risonhas deste quadro. Havia misérias materiais e
morais, é certo. Mas poucos eram os que mediam em toda a sua extensão
a importância destes fatos. A grande maioria esperava que a ciência e
o progresso resolvessem todos os problemas. A primeira guerra mundial
veio opor um desmentido terrível a estas perspectivas. Em todos os sentidos,
as dificuldades se agravaram incessantemente até 1939. Sobreveio a segunda
guerra mundial, e com isto chegamos à condição presente, em que se pode
dizer que não há sobre a Terra uma só nação que não esteja a braços,
em quase todos os campos, com crises gravíssimas.
Em outras palavras, se analisamos a vida interna de cada nação, notamos nela
um estado de agitação, de desordem, de desbragamento de apetites e ambições,
de subversão de valores que, se já não é a anarquia franca, em todo o caso
caminha para lá. Nenhum estadista de nossos dias soube ainda apresentar o
remédio que corte o passo a este processo mórbido, de envergadura universal.
2) As
guerras mundiais. A de 1914-1918 pareceu uma tragédia insuperável.
Na realidade, a de 1939-1945 a superou do ponto de vista da duração,
da universalidade, da mortandade e das ruínas que ocasionou. Ela
nos deixou a dois passos de uma nova guerra, ainda pior sob todos
os pontos de vista. Massas humanas têm vivido estes últimos anos
no terror dessa perspectiva, cônscias de que um terceiro conflito
mundial talvez acarrete o fim de nossa civilização.
A
atualidade das revelações de Fátima
O
elemento essencial das mensagens do Anjo de Portugal e de Nossa Senhora
consiste, como veremos, em abrir os olhos dos homens para a gravidade
desta crise universal, em lhes ensinar sua explicação, à luz dos planos
da Providência Divina, e em indicar os meios necessários para evitar
a catástrofe. É a própria história de nossa época, e mais do que isto
o seu futuro, que nos é ensinado por Nossa Senhora.
O
Império Romano do Ocidente se encerrou com uma catástrofe, iluminada
e analisada pelo gênio de um grande doutor, que foi Santo Agostinho.
O ocaso da Idade Média foi previsto por um grande profeta, que foi São
Vicente Ferrer. A Revolução Francesa, a qual marca o fim dos Tempos Modernos,
foi prevista por outro grande profeta, que foi ao mesmo tempo um grande
doutor, São Luís Maria Grignion de Montfort. Os Tempos Contemporâneos,
que parecem na iminência de se encerrar com nova crise, têm um privilégio
maior: veio Nossa Senhora falar aos homens.
Santo
Agostinho não pôde senão explicar para a posteridade as causas da tragédia
que presenciava. São Vicente Ferrer e São Luís Grignion de Montfort procuraram
em vão desviar a tormenta: os homens não os quiseram ouvir. Nossa Senhora
a um tempo explica os motivos da crise e indica o seu remédio, profetizando
a catástrofe caso os homens não a ouçam. De todo ponto de vista — pela
natureza do conteúdo como pela dignidade de quem as fez — as revelações
de Fátima sobrepujam, pois, tudo quanto a Providência tem dito aos homens
na iminência das grandes borrascas da História. Os diversos pontos das
revelações relativos a este tema constituem propriamente o elemento essencial
das mensagens. O mais, por importante que seja, é mero complemento.
O
pressuposto terrível: crise religiosa e moral
Em vista dos pecados do mundo atual, a piedade contemporânea deve ter
um caráter reparador e expiatório
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Não
há uma só aparição em que não se insista sobre um fato: os pecados da
humanidade se tornaram de um peso insuportável na balança da justiça
divina. Esta a causa recôndita de todas as misérias e desordens contemporâneas.
Os pecados atraem a justa cólera de Deus. Os castigos mais terríveis
ameaçam pois a humanidade. Para que não sobrevenham, é preciso que os
homens se convertam. E para que se convertam, é preciso que os bons orem
ardentemente pelos pecadores e ofereçam a Deus toda a sorte de sacrifícios
expiatórios.
Vemos
que o pensamento constante de todas as mensagens é este. O mundo está a
braços com uma terrível crise religiosa e moral. Os pecados cometidos
são incontáveis. E são a verdadeira causa da desolação universal. O modo
mais acertado para remediar seus efeitos consiste na oração e na reparação.
O
falso otimismo e as mensagens de Fátima
Generalizou-se um otimismo febricitante que rejeita tudo o que evoca
a idéia de sofrimento e expiação
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Os
católicos, por espírito de acomodação, por oportunismo, pelo desejo pueril
de concordar em tudo com este século, para o conduzir por vias extremamente
problemáticas a uma conversão quimérica, pensam, agem, sentem-se neste
mundo de crise e de derrocada como se estivessem no século XIII, com
São Luís reinando em França, São Fernando em Castela, São Tomás de Aquino
e São Boaventura iluminando a Igreja com o esplendor de sua ciência e
de sua virtude. Quando hoje em dia, só entre rapazolas e moçoilas se
encontram ainda pessoas que não tomaram consciência da gravidade evidente
da crise por que passamos, esses nossos católicos, muitas vezes quarentões
ou mais do que isso, entram freneticamente na farândola dos despreocupados
e entoam loas e hinos a uma situação que a outros arranca gemidos de
angústia e até gritos de dor. E se há quem lhes deseje abrir os olhos,
enfurecem-se. Tolerantes para com tudo e para com todos, não podem suportar
que se mostre a gravidade da situação em que estamos.
A
palavra de Nossa Senhora, a palavra do Papa, bastarão para os convencer?
Não parece provável. Mas pelo menos podem imunizar contra essa onda de
otimismo estúrdio aqueles que talvez se sentissem propensos a lhe dar
sua adesão.
A
mensagem de Fátima e os católicos de vistas curtas
Ao
lado deste otimismo febricitante, que gostaria de fazer do apostolado
uma perpétua festinha de adolescentes, um eterno pic-nic que aborrece
na própria piedade tudo quanto pode evocar a idéia de dor — os Crucifixos
em que a Divina Vítima figura com suas Chagas, vertendo o Sangue redentor,
os paramentos pretos para as missas de defunto, etc. — temos também outro
defeito a considerar. É a abulia. Existe uma falsa piedade que desvia
os homens da consideração de todos os problemas grandes. Dissolve-se
a Civilização Cristã, rui o mundo, convulsiona-se a Terra? O homem intoxicado
por essa forma de piedade nada vê, nada sente, nada percebe. Sua vida é apenas
sua vidinha, no cumprimento correto e pacato dos seus pequenos deveres
individuais, dos seus pequenos atos de piedade, na solução exclusiva
de seus pequenos casos de consciência. Seu zelo não vai mais longe do
que seus horizontes, e estes, dói dizê-lo, vão pouco além da ponta de
seu nariz. Se se lhe fala de política, de sociologia, de filosofia e
teologia da História, de apologética, desvia-se até com certo medo: o
medo que os termitas têm à luz do sol. Para ele também, Fátima contém
uma grande lição. Nossa Senhora desceu à Terra para atrair para este
imenso panorama o zelo das almas. Ela quer piedade, quer reparação, mas
baseia seu desejo numa visão imensa dos grandes interesses de Deus em
toda a vastidão da Terra.
Não
se trata, dentro das perspectivas sem limites de Fátima, de salvar só esta
ou aquela alma individualmente considerada. Trata-se de ver mais alto
e mais longe. É pela salvação de toda a humanidade que se há de lutar,
pois não é só este ou aquele homem, mas são legiões de almas que ameaçam
perder-se em uma crise das mais graves da História. E é para essa tarefa
imensa que Nossa Senhora pede não um Cireneu, mas muitos, muitíssimos
deles, falanges inteiras.
Em
Fátima não há apenas um apelo para que os três pastorinhos façam penitência.
Este apelo se dirige ao mundo inteiro. É toda a piedade contemporânea
que deve ter, por assim dizer, um forte colorido reparador e expiatório.
As
mensagens de Fátima e a “heresia das obras”
Notemos
ainda outro ponto. Ninguém pode duvidar da importância das obras de apostolado.
Os Papas conclamam para elas diariamente os fiéis. Entretanto, em sua
extrema concisão, Fátima nada de particular nos diz sobre isto. Porque
a Providência não as julgue necessárias, urgentes? Quem poderia admitir
tal aberração? Então por que o silêncio de Fátima? É que vivemos em uma época
dominada pelos sentidos, em que os homens reconhecem facilmente a necessidade
de agir, pois a ação é algo que os sentidos percebem, cuja eficácia muitas
vezes é suscetível de ser avaliada por cifras, por estatísticas, por
resultados palpáveis. E por isto não é tão difícil atrair a atenção das
almas verdadeiramente zelosas para a importância da ação. Mas é e continua
a ser muito difícil atraí-las para o que é espiritual, interior, invisível.
E por isto a oração, a vida interior, o homem as compreende mais dificilmente,
a elas dedica menos tempo e menos interesse. É bem compreensível que
em Fátima Nossa Senhora tenha insistido na necessidade da oração e da
penitência, a ponto de fazer disto o elemento essencial de sua mensagem.
Que belo proveito teria tirado deste fato Dom Chautard, se no seu tempo
todo o assunto “Fátima” estivesse tão esclarecido quanto hoje.
Não
basta rezar: é preciso expiar
Nosa Senhora entretanto
insistiu na necessidade da oração e da penitência, elementos essenciais
de sua mensagem
|
Por
fim, um ponto essencial. Nossa Senhora não fala apenas em oração. Ela
quer expiação, sacrifício. Haverá época em que mais se tenha fugido da
dor? Haverá época em que menos se tenha falado sobre a necessidade da
mortificação? Haverá época em que menos se tenha tido a noção da importância
do sacrifício? Pois é para este ponto que Nossa Senhora atrai especialmente
nossa atenção. Nos grandes séculos de piedade, a expiação era um fato
freqüente na vida dos homens e dos povos. Faziam-se imensas peregrinações
para expiar pecados. Nas grutas, nas florestas, nos claustros, encontravam-se
verdadeiras legiões de almas votadas à vida de expiação. Nos testamentos,
deixavam-se fortunas inteiras para obras pias ou de caridade, em remissão
dos pecados. Havia confrarias especialmente destinadas a fomentar a penitência.
Havia procissões expiatórias em que tomavam parte cidades inteiras. Hoje
não faltam manifestações coletivas de piedade. Mas, por mais que a Igreja
nos incite à penitência, que papel ocupa esta em tais manifestações?
Que papel ocupa ela em nossa vida privada? Pequeno, pequeníssimo até.
Parece indiscutível que, também neste ponto, Fátima nos dá preciosas
lições.
***
Fátima,
a Grande Esperança
Este é o
título do mais recente livro sobre a Mensagem de Fátima lançado
no Brasil. Sua principal característica consiste em avaliar objetivamente
a atual condição sócio-político-cultural-religiosa de nossa civilização
ex-cristã, em função da mensagem de Fátima, 88 anos depois das
aparições na Cova da Iria.
De
autoria do conhecido apóstolo de Fátima, Sr. Marcos Luiz Garcia,
a obra demonstra que, caso Nossa Senhora tivesse sido ouvida
e seus pedidos atendidos pelos homens, o mundo não estaria tão
açoitado pelas crises terríveis que abalam os alicerces fundamentais
da sociedade, como a família e o direito de propriedade. E contrapõe à atual
situação do mundo o rumo que, tudo indica, ele teria tomado se
tivesse sido dócil aos apelos da Santíssima Virgem. O livro termina
com sólida demonstração de como se justificam as maiores esperanças
para aqueles que levarem inteiramente a sério os apelos de Nossa
Senhora.
A
obra é prefaciada pelo Revmo. Cônego José Luiz Marinho Villac
— autor da seção A Palavra do Sacerdote, desta revista,
conhecido por sua adesão e devoção a Nossa Senhora de Fátima. “Fátima,
a Grande Esperança” mereceu importante carta de apoio de
D. Juan Rodolfo Laise, Bispo emérito de San Luis (Argentina),
atualmente residindo em Roma no mesmo convento onde viveu o renomado
Padre Pio, recentemente canonizado por João Paulo II.
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(Catolicismo, nº 29,
maio/1953)
Páginas: 1 2 3
Veja:
http://www.catolicismo.com.br/
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