Reforma universitária: tentativa de sovietizar o ensino nas universidades brasileiras
10/06/2005
Leo Daniele
Um
tsunami semelhante ao da Reforma Agrária,
que varre a agricultura, investe agora contra o ensino superior privado
e a autonomia universitária.Ao
lado dos "sem-terra"e "sem-teto" avançam
os "sem-universidade". Completa-se o triângulo
da subversão no Brasil
No
campus da Universidade de Harvard, vê-se a estátua representando um homem distinto,
sentado, com um livro na mão. É John Harvard, rico agricultor que financiou
a fundação da famosa instituição. Pouco atrás, a biblioteca Widener, considerada
a quinta do mundo. E, à esquerda, a famosa torre do Memorial de Harvard.
Tudo conduz à impressão de um centro de excelência, uma instituição de
elite. E os numerosos prêmios Nobel conferidos a professores da Casa transformam
essa impressão em certeza.
Ao lado de Harvard, poder-se-ia mencionar Cambridge,
Oxford, Paris, Bolonha, Coimbra, Salamanca, Princeton, Yale, o M.I.T.,
Columbia e tantas outras.
E
o Brasil? Quando foi fundada a Universidade de São Paulo (USP), foram contratados vários expoentes das universidades européias,
que elevaram sensivelmente o nível acadêmico no Brasil. Começava então
um caminho rumo à excelência, que hoje é urgente retomar.
Seria
preciso diminuir, e não aumentar o espaço
que separa o mundo acadêmico brasileiro das grandes universidades. Pois
existe nos brasileiros aptidão para instituir centros universitários nobres
como os mencionados. Um exemplo: assevera Maurício de Sousa Neves Filho,
presidente do SINDEPES-DF, que “no campo do desenvolvimento de sistemas
de informatização, o profissional brasileiro se vem destacando pela criatividade
e pelo enorme potencial nas principais e maiores empresas do mundo”.(1)
É triste recordar, no entanto, que o Brasil foi
o último colocado numa avaliação do ensino de matemática no mundo. Há muito
o que melhorar também no ensino básico. Como observa o ex-reitor da Universidade
de São Paulo, consultor Roberto Leal Lobo, “o governo, no Brasil, abandona
o ensino fundamental para investir no ensino superior. É como começar a
casa pelo telhado”.(2) O próprio ministro Tarso Genro reconhece que “55%
dos alunos da quarta série do ensino fundamental não compreendem um texto
e, em Matemática, 51% dos alunos tiveram desempenho muito crítico”.(3)
A
ofensiva destruidora da “deforma universitária”
Entretanto
a situação pode piorar ainda, se não
houver reação. Presa apenas por um fio, como na mitologia grega, paira
sobre nossas cabeças a espada de Dâmocles da reforma universitária.
O presidente Lula ao lado do coordenador nacional do MSU, Sérgio
Custódio da Silva, durante cerimônia do lançamento do Programa
Universidade para Todos (Prouni)
|
Em
dezembro passado, o Ministério de Educação e
Cultura (MEC) lançou a versão preliminar de um anteprojeto em rota de colisão
direta e violenta com o anseio de melhora do nível universitário. Anteprojeto
que se poderia resumir em três palavras: adeus à excelência! Ou
simplesmente: sovietizando...
Após um bombardeio cerrado de justas críticas,
tal versão preliminar do projeto foi retirada para ser revista. Aguarda-se
agora a apresentação do texto definitivo. Mas o anteprojeto era tão defectivo,
que é de se duvidar que simples aperfeiçoamentos o possam corrigir.
O
professor universitário e economista Roberto
Macedo qualifica o canhestro documento como “deforma universitária”.(4) É dizer
tudo em duas palavras. Pois, se aprovado, ele vai aleijar gravemente o
ensino superior.
O
professor e filósofo Denis Lerrer Rosenfield
adverte: “Não nos enganemos. Está em curso um verdadeiro desmonte das universidades
brasileiras, públicas e privadas, federais e estaduais, pelo anteprojeto
de lei elaborado pelo Ministério da Educação. Com um vocabulário pretensamente
social, o projeto visa a ideologizar o ensino superior, estabelecer formas
de controle partidário por organizações ditas sociais e abolir o mérito
como critério de conhecimento”.(5)
Aviltando
a nobreza dos centros de excelência que
devem ser as universidades brasileiras, o anteprojeto quer impor o reprovável
figurino do nivelamento e da despersonalização. Com isso ficará sepultada
a idéia de que os centros de ensino superior tenham personalidade própria,
formando “um tipo humano específico, o qual, por sua vez, pode marcar
todo o ambiente da cidade que viva da universidade e em torno dela”,(6)
como define Plinio Corrêa de Oliveira.
Como
se fará essa despersonalização? Através de
uma campanha estrategicamente planejada, cujas linhas gerais estão contidas
no anteprojeto. Estudemos metodicamente seus principais aspectos:
1
– O anteprojeto, as cotas e a agitação;
2
– A autonomia universitária;
3 – Preconceito contra o ensino privado.
1
- O ANTEPROJETO, AS COTAS E A AGITAÇÃO
Candidatos às vagas de cota para negros inscrevem-se no vestibular
na Universidade de Brasília (UNI)
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Recentemente entrou em cena o Movimento dos
Sem Universidade (MSU), com boné e tudo o mais.(7) O MSU é menos
conhecido — por enquanto — que seus congêneres: o movimento dos sem-terra
e o movimento dos sem-teto.
Trata-se,
como os outros “sem”, de uma criatura da esquerda católica, e ela o reconhece. Surgiu “da organização
dos Cursinhos Populares, do ativismo social da Pastoral da Juventude do Meio Popular
e da Pastoral da Juventude”.(8) O nome foi sugerido por Dom Pedro Casaldáliga,
conhecido bispo da esquerda católica e patrono dos sem-terra.(9)
Qual é o tema da movimentação do MSU? Mais imediatamente,
a pretensão de colocar carentes sem a devida preparação nas universidades
públicas, ocupando vagas dos melhor preparados.
O
golpe é velho: procura-se açular alguém a quem
falta alguma coisa contra os que a possuem, manipulando duas reprováveis
tendências da natureza humana decaída: a ambição e a inveja.
Carentes, índios e negros poderão ser aprovados
no vestibular com notas baixas. Na UnB, onde já está em funcionamento um
sistema de cotas, pode-se ter idéia do que sucederá se o anteprojeto for
convertido em lei. Em julho de 2004, nenhum dos candidatos aprovados pelo
sistema de cotas no vestibular, de 15 entre 61 cursos da UnB, tirou nota
suficiente para obter vaga pelo sistema normal.(10)
A 7a Vara
da Justiça Federal deu ganho
de causa a um jovem que tinha sido preterido no curso de engenharia química
da UFPr, por causa do sistema de cotas. Ele tinha obtido 611,3 pontos,
enquanto o melhor cotista tinha apenas 489,3.(11)
Ives Gandra: "A título de colocar carentes, índios e negros
na Universidade, [...] retiraram a oportunidade de 10% de alunos
que poderiam entrar por mérito"
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Como
afirma o conhecido jurista Ives Gandra da Silva Martins, “a título de colocar carentes, índios e negros na Universidade,
[...] retiraram a oportunidade de 10% de alunos que poderiam entrar por
mérito”.(12)
Isto
não faz sentido. Já que se fala tanto em função
social, qual o efeito social da disseminação desses diplomados na sociedade,
simpáticos mas despreparados. Será benéfico para o desenvolvimento do País?
E para eles mesmos?
Quem
entrou por causa das cotas, sem estar qualificado, vai ter problemas
depois. Se não desistir durante o curso, terá de enfrentar
em desvantagem a concorrência no mercado de trabalho, onde — todos sabem
— não há cotas. Ele terá de pagar seu preço por ter querido fugir da realidade.
E
a incidência das tramóias nesse processo? Os
candidatos a uma vaga no sistema de cotas não precisam provar nada; basta
declararem que são negros ou índios. Um jornal publicou foto de uma jovem
que ganhou uma vaga especial para o vestibular. Ela se declarara negra.
Não é impossível que tivesse antepassados negros, mas a aparência não era
esta...
Os
méritos dos bons alunos das escolas públicas
ficarão desvalorizados, enquanto não poucos oportunistas desbancarão candidatos
válidos.
A
voz dos interessados: bom senso
Os
campeões da igualdade e da “inclusão” social,
em sua paixão destemperada, nada mais fizeram que humilhar a simpática
raça negra, a que tanto deve o Brasil.
Claudimara
Cristina Carvalho afirma: “Sou negra, e entrei para a faculdade sem precisar
de cotas. Aliás, na faculdade em
que prestei, não há diferença para negros. Se o não-negro dispensa cotas
para entrar na faculdade, por que nós negros precisamos?”(13)
No
fundo, para a autora desses comentários, a reserva
de cotas para negros recende a racismo. É o pensamento do negro Ingo da
Silva, que diz: "Todos os negros devem rejeitar isso, porque mais
parece esmola. [...] Vão dizer: ‘Está cursando porque deram uma mãozinha'”.(14)
As respostas acima transcritas fazem parte de uma
enquete nos seguintes termos: “Você concorda com a reserva de vagas
para negros nas universidades públicas?” E o resultado da enquete foi
esmagador: 86,18% não, 13,82% sim.(15)
O
aposentado Luciano José dos Santos foi beneficiado
pelo sistema de cotas privilegiadas na UNIFESP. Mas ao recusar o benefício,
disse: “Não vou desperdiçar esta vaga que poderia ser de um jovem".(16)
Ele mostrou ter senso da realidade e de justiça.
Também cheio de bom senso é o texto do Conselho
de Graduação da Universidade de São Paulo. “O viés assistencialista não
contribuirá para a formação de pessoal apto a construir um país que gere
conhecimento e não seja caudatário de outras nações”.(17)
Não é lógico adotar o assistencialismo como critério
de escolha, quando se visa à competência, pois a fuga da realidade geralmente
não produz bons resultados. Imagine o leitor que, na hora de escolher um
comandante para o avião que o vai levar, a companhia aérea opte por Fulano
de Tal, não porque é bom aviador, mas por qualquer outro critério; por
exemplo, porque é pai de muitos filhos. Se o soubessem, não poucos passageiros
ficariam preocupados...
Exagero?
Então veja esta. A Orquestra Sinfônica
de Detroit escolhia seus artistas por meio de uma comissão que ficava detrás
de um biombo, para ser perfeitamente imparcial e selecioná-los apenas pela
qualidade da execução musical. Mas houve quem qualificasse o biombo de
racista!(18)A esquerda é incontentável. Grita contra a discriminação, mas
quando se coloca um biombo para não discriminar, ela protesta.
No
Brasil, a proposta cotista pode parecer nova. Mas nos EUA é velha de mais de 30 anos, tendo as cotas surgido após os
conflitos raciais dos anos 50-60. Muitos dos argumentos em que se apóiam
foram trombeteados pelo líder esquerdista Martin Luther King. Hoje as cotas
especiais lá são tidas como sumamente contraproducentes.
Sobre
o desempenho das cotas nos Estados Unidos, remetemos o leitor para o
excelente artigo de Luís Dufaur Cotas na Universidade:
achatamento e luta de classes (Catolicismo, agosto/2004).
Discriminação
esquerdista contra o ensino privado
Não serão apenas os não-índios e não-negros que
poderão ser discriminados, mas também todos os alunos de escolas particulares,
segundo prescreve o anteprojeto do MEC. 50% das vagas das universidades
estatais estão reservadas para os estudantes de escolas públicas.(19)
Se
as escolas públicas fossem tão boas quanto as
escolas particulares — não estamos falando dos cursos superiores — não
seria preciso o privilégio de terem “pelo menos 50%” das vagas no
exame vestibular. Neste artigo, portanto, está embutido o reconhecimento
de que as escolas particulares de uma maneira geral são melhores que as
públicas. Finalmente!
Pete
Du Pont argumenta com acerto: “Se a nossa política é falsificar a medição das habilidades em lugar de melhorar as
aptidões dos menos hábeis, então nós nos enganamos a nós mesmos e pomos
nossa sociedade em risco”.(20)
O
anteprojeto está fazendo como alguém que, para
não ter febre, quebra o termômetro. Escamoteia o medidor do nível de preparo,
que é o vestibular... A exemplo de seus similares sem-terra e sem-teto,
com o sistema de cotas privilegiantes o projeto cria uma nova categoria
de "invasores": os sem-universidade. Ao que parece, a esquerda
não consegue principiar nada sem algum tipo de invasão.
Motor
da “luta de classes” não é favorecer carentes
Ninguém é contra que um “sem-universidade” se torne
um “com-diploma”, desde que o faça adequada e ordenadamente. Não por meio
da bolorenta “luta de classes”, e sim através de um aperfeiçoamento do
ensino fundamental.
A
“luta de classes” — nunca é demais repetir —
não tem como motor o desejo de favorecer os carentes. Diz Henri Lefèbvre,
professor francês comunista, um dos mais conhecidos teóricos do marxismo: “O
marxismo não alimenta um humanismo sentimental e choramingão. [...] O marxismo
não se interessa pelo proletariado enquanto fraco, mas enquanto ele é uma
força”.(21)
É bom sabermos que, como garante esse teórico do
marxismo, o triângulo “sem” — sem-terra, sem-teto, sem-universidade — não é utilizado
pela esquerda por ser carente, mas por ser uma força psicológica e social.
Liou-Chao-Chi,
Secretário do Partido Comunista
Chinês, é ainda mais claro: ajudar os sem-terra “é um ideal de filantropos,
não de marxistas”.(22) Ou seja, os marxistas só se interessam pelos
menos favorecidos como massa de manobra, como ferramenta de luta, como
“bucha para canhão”.
Mas
para que haja luta de classes é preciso inflamar
a sensibilidade racial. Se ela não existe, é preciso criá-la. E aqui chegamos
ao ponto nevrálgico da questão.
Veja-se
o que declarou ao site Mundo Negro uma aluna cotista e negra da UERJ:
“Por incrível que pareça, os meus colegas
me surpreenderam. Ainda não vivenciamos nenhum tipo de preconceito partindo
deles”.(23) Criar preconceitos e contra-preconceitos é a principal finalidade
de movimentos como o estreante MSU (Movimento dos Sem-Universidade).
Seria
ingênuo julgar que um esquerdista fica contente
quando lê uma declaração como a da cotista negra, de que não havia visto
preconceito. Mas deveria...
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Veja:
http://www.catolicismo.com.br/
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