Reforma universitária: tentativa de sovietizar o ensino nas universidades brasileiras
10/06/2005
Leo Daniele
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- ANTEPROJETO FERE A AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA
Tarso Genro alude explicitamente ao Movimento dos Trabalhadores
Rurais Sem Terra - MST como participantes
dos conselhos comunitários
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Os
planos da esquerda não se limitam ao sistema
de cotas especiais. Há muito mais. “O Governo tenta impor um modelo único
de Universidade”, afirma Éfrem Maranhão, presidente do Conselho de
Reitores das Universidades Brasileiras”.(24) Vejamos
como será esse modelo único do ponto de vista da autonomia universitária.
Ela
está garantida pelo art. 207 da Constituição
Federal, segundo o qual “as universidades gozam de autonomia didático-científica,
administrativa e de gestão financeira e patrimonial”. Entretanto, o
anteprojeto torna obrigatório em todas as universidades, sejam públicas
ou particulares, “a organização de conselho comunitário social, constituído
por representantes da sociedade civil, da própria instituição e da administração
pública, direta e indireta, responsável pela supervisão e acompanhamento
de suas atividades”.(25)
Quem
irá fazer parte desse conselho? O reitor da
universidade; representantes do Poder Público de qualquer nível de governo;
e representantes de entidades de fomento científico e tecnológico, entidades
corporativas, associações de classe, sindicatos e da sociedade civil.(26)
Ou seja, como se diz em italiano, “tutti quanti” (“todo mundo”).
Tarso
Genro menciona explicitamente como participante dos conselhos o Movimento
dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Confira:
“A interlocução da universidade com organizações da sociedade é ampla,
na nossa proposta. [...] Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra,
Ordem dos Advogados do Brasil, Conselho Federal de Medicina, Confederação
Nacional da Indústria e Federação Nacional dos Jornalistas, por exemplo”.(27)
Em
outra ocasião ele cita como exemplo de crítica
preconceituosa “o questionamento de como o MST vai participar desse
debate”(28) Portanto, o MST vai mesmo participar.
Denis
Rosenfield constata: “A consulta à ‘sociedade
civil’, tão apregoada em todo o anteprojeto, é outra dessas expressões
que encobrem, sob um rótulo aceitável, a participação direta do MST e da
CUT nos processos internos da universidade, viabilizando uma ideologização
e uma partidarização das instâncias universitárias”.(29)
MST?
Mas que relação pode ter o MST com a universidade?
Seria uma boa pergunta para ser feita ao Sr. ministro Tarso Genro, uma
vez que perguntar não ofende. Este, segundo o mesmo articulista, “não
escondeu a consulta que fez ao MST, organização revolucionária que usa
sistematicamente da violência, para decidir dos rumos da reforma universitária.
O artigo 3º, inciso II, é particularmente claro, embora, como sempre, elíptico:
a educação superior atenderá às demandas específicas de grupos e organizações
sociais, inclusive do mundo do trabalho, urbano e do campo”.(30)
Os
“conselhos comunitários sociais”: grupos de pressão
Militantes do MST
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Segundo
o anteprojeto, em cada universidade haveria, lado a lado, a direção oficial
e um poder paralelo –– o Conselho Comunitário Social.
O
artigo 20 define que esses conselhos têm “a finalidade
de assegurar a participação da sociedade” nos assuntos universitários;
vão “emitir relatório de avaliação” (inciso IV); devem “elaborar e encaminhar
subsídios para a fixação das diretrizes e da política geral da universidade”
(inciso V).
Comenta
“O Globo”: “Na verdade, trata-se de abrir de uma vez por todas a universidade à pressão de grupos políticos organizados.
O principal instrumento dessa intervenção serão ‘conselhos comunitários
sociais’, em que reitores se sentarão lado a lado com sindicalistas e representantes
da ‘sociedade civil’”.(31)
“A
proposta do MEC padece de inegável assembleísmo”,
afirma o Prof. Eduardo Storópoli, reitor da Uninove e presidente da Associação
Nacional de Centros Universitários (Anaceu).(32)
Em
outros termos, o Conselho será um grupo de pressão,
um poder alternativo que certamente vai tornar-se “infernizante” e “azucrinante”,
como se orgulha de ser o MST.(33) Um exemplo,
apenas. O artigo 20 prevê que dito Conselho deve promover “a avaliação
social de sua efetividade enquanto instituição”. Que quer dizer isto?
A formulação é vaga, e deixa a porta aberta a todo tipo de arbitrariedade.
Maria
Helena Guimarães de Castro, que foi secretária
executiva do MEC, observa a presença de itens no anteprojeto que “estabelecem
um tipo de controle externo que, em alguma medida, fere o princípio de
autonomia estabelecido na Constituição”.(34)
Alguém com tendência para o otimismo poderá objetar:
esse conselho vai se limitar a ser uma concha para discursos e politicagem,
sem poder efetivo algum; não será propriamente um poder, mas um órgão meramente
opinativo. É o que o MEC procura inculcar, garantindo que os conselhos
comunitários só terão “caráter consultivo”,(35) e portanto não são um poder paralelo. Mas é precisamente
o que acontece numa primeira fase com todo poder paralelo! Só depois é que
vem algo comparável ao “todo poder aos soviets” da Rússia em 1917.
“Meta-se
com seus assuntos, que eu cuido dos meus”
Numa época em que os pais resolviam sobre o casamento
dos filhos, um rapaz timidamente bateu à porta do escritório do progenitor
e perguntou:
—
Papai, poderia eu saber se são fundados os rumores
de que eu vou me casar com Fulana de Tal?
O pai, mal humorado, respondeu:
— Meta-se com seus assuntos, que eu cuido dos meus!
Do
jeito como está sendo encaminhada essa reforma,
os rumos acadêmicos acabarão sendo fixados por elementos estranhos às universidades.
Os reitores e pró-reitores, curiosos por saber para onde serão levados,
receberão a resposta de um ativista: Meta-se com seus assuntos, que eu
cuido dos meus.
Exagero! –– dirá alguém.
Seja como for, a historieta vem à mente quando se fica sabendo que, numa
reunião importante sobre a reforma universitária, organizada pelo MEC em
São Paulo, havia assento “até para o MST, a Contag e a Via Campesina,
mas não para os reitores das três universidades públicas de São Paulo,
responsáveis por metade da pesquisa realizada no País”.(36)
Assim
vai a autonomia universitária. Réquiem por
ela, se não houver reação da sociedade.
Gestão
interna das universidades: tumultuada
"Nossa revolução tem isso de eminentemente original, ela
criou a dualidade do poder...
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Além dessa invasão de elementos estranhos nos conselhos
das universidades, o anteprojeto também tumultua a própria gestão interna
dos estabelecimentos de ensino superior. Os reitores das universidades
federais e os pró-reitores das particulares serão escolhidos mediante eleição
direta, de que participarão os corpos docente, discente e os servidores,
técnicos e administrativos.(37) Além disso, não é necessário
que o eleito seja um professor; pode ser um estudante ou um funcionário.
Observa
Roberto Lobo, ex-reitor da Universidade de São Paulo, que a eleição direta do reitor é outra das inovações
do anteprojeto. “É puramente
ideológica. Em Cuba, quem escolhe o reitor da Universidade de Havana é o
comandante Fidel”.(38)
Pode-se
imaginar que a politicagem eleiçoeira e,
pior ainda, a política partidária se infiltre e crie um clima propício
para uma agitação que nada terá de acadêmica.
O
anteprojeto vai inaugurar “um neo-corporativismo — com corporações e sindicatos participando de decisões administrativas,
acadêmicas, elegendo reitor”, afirma Maria Helena Guimarães de Castro.(39)
Outro
instrumento do solapamento da autoridade é o
plano qüinqüenal (Plano de desenvolvimento institucional – PDI) que, além
de apresentar o projeto pedagógico da instituição, deve atender “a demandas
específicas de grupos e organizações sociais, inclusive do mundo do trabalho,
urbano e do campo”.(40) Aqui há uma alusão translúcida à CUT
e ao MST, mais uma vez inseridos compulsoriamente na vida das universidades.
O
PDI também conterá indicações orçamentárias e
programas visando a “promoção igualitária e a inclusão social”.(41)
São portanto diversos corpos estranhos a se infiltrar
no organismo acadêmico. A que ficará reduzida a autonomia universitária?
O
golpe, quando previsto, é menos duro
"...Ao lado do governo da burguesia, formou-se outro governo,
ainda fraco, enbrionário, mas que entretanto existe de fato,
incontestavelmente, e cresce". |
A
palavra “soviético” foi pronunciada com certa
freqüência a respeito da Reforma Universitária, pelo que é impossível deixar
de tratar deste assunto. Paulo Renato Souza,(42)
André Petry,(43) Ali Kamel(44) e Monica Weinberg(45) acentuam a “orientação
soviética” do anteprojeto, juntamente com Denis Lerrer Rosenfield, que
afirma:
“Estamos
diante de uma renovação do ‘sovietismo’
ou, ainda, de uma subordinação do conhecimento a critérios determinados
como sociais por burocratas de coloração partidária. O stalinismo ganha,
assim, uma faceta institucional, pretensamente correta. O PT das trevas
mostra a sua face”.(46)
Que significa nesses textos a alusão a "soviético"? Será um exagero?
Mero recurso retórico?
Para
responder, vale a pena invocar um precedente histórico.
Corria o ano de 1917. Como foi que os soviets abocanharam
o poder na Rússia? As etapas foram duas: na primeira, os vermelhos criaram
uma dualidade de poderes(47) ou, em outras palavras,
um governo paralelo, alternativo. Havia dois pólos decisórios em conflito
permanente: um oficial, e outro o dos soviets; um monstro com duas
cabeças no mesmo corpo, travando entre si uma luta mortal.
A Reforma Universitária parece ter se inspirado nessas palavras
do ditador comunista
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Explica
Lenin — visto aqui não apenas como líder
comunista, mas como tático da subversão: "Nossa revolução tem isso
de eminentemente original, ela criou a dualidade do poder. [...] Mas em
que consiste a dualidade do poder? É que, ao lado do Governo Provisório,
do governo da burguesia, formou-se outro governo, ainda fraco, embrionário,
mas que entretanto existe de fato, incontestavelmente, e cresce".(48) Sim, cresceu tanto que tomou conta do país e de boa
parte do mundo. E ceifou quase cem milhões de vidas em todo o planeta.(49)
Numa
segunda etapa, o poder paralelo desbancou o poder oficial pela força.
O slogan passou de “dualidade de poderes” a “todo
poder aos soviets”. Não mais dualidade, mas unidade totalitária, monocromática.
Portanto, numa primeira fase competiam dois poderes
paralelos –– o oficial e o subversivo. Na fase
seguinte a subversão tomou o poder, e ela mesma acabou com a dualidade.
A
dualidade de poderes é uma perspectiva apenas
para as universidades? Ou para toda a sociedade brasileira? A questão excede
o âmbito do presente trabalho, mas a pergunta fica.
Quanto à reforma/revolução universitária
brasileira, tudo faz crer que caminha para implantar uma dualidade semelhante.
Chama
a atenção que, dos 166 títulos que compõem
a seção de ciências sociais do site do MEC “Domínio Público”, 86
são de intelectuais de esquerda ou sobre eles. E 60 títulos são de Marx
ou sobre ele.(50)
O
golpe, quando previsto, é menos duro, diz um
antigo provérbio... Sejamos previdentes. Mas não fiquemos apenas numa cômoda
previsão. Vamos à denúncia e ao protesto.
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Veja:
http://www.catolicismo.com.br/
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