2006 O vagalhão da desordem universal


09/01/2007

Luis Dufaur

A ordem mundial tinha fendas profundas, mas acreditava-se que nunca racharia, graças a um falacioso acordo entre o bem e o mal. Em 2006, esquerdas civis e eclesiásticas tudo fizeram para explodir o que ainda restava de tal ordem, e o vagalhão do caos investiu furiosamente.

Entre os foliões irrefletidos do Réveillon de Nova York (2005-2006) havia rostos que não conseguiam sorrir. O cortejo de catástrofes de 2005, como o tsunami no Índico e o furacão Katrina em Nova Orleans, tirara de muitos a vontade de festejar. E uma interrogação lavrava os subconscientes: o que viria em 2006? Prosseguiria aquele séqüito inquietante de calamidades naturais? Ou haveria uma trégua na continuidade de desencantos, à medida que o futuro se torna presente?

Com freqüência, no ponto de partida de um período está contido como em semente o que nele vai se desenrolar. Mas, por vezes, verifica-se o oposto do que se esperava. Foi o caso de 2006?

A bela Florença aproximou-se do Natal coberta de neve, fato raríssimo. Não foi sinal de catástrofes notáveis, mas enfatizou a sensação crescente de que uma desordem de fundo se instalou na natureza. Os ecologistas tentam tirar partido dela para seus interesses ideológicos, mas suas explicações não alcançam unanimidade.

Em 2006, as cataratas do Iguaçu secaram como há 70 anos não se via [foto 1], mas também recordes de neve sepultaram casas no Japão como há décadas não acontecia, afundaram prédios na Rússia e paralisaram vastas regiões americanas. Os vulcões Merapi na Indonésia e Tungurahua no Equador [foto 2] obrigaram à evacuação de populações: foram casos mais noticiados do que as espetaculares erupções dos vulcões Mayon nas Filipinas, Ubinas no Peru, Tuvurvur na Papuásia ou Augustine no Alaska.

O calor fez 140 mortos na Califórnia em um mês, maior número desde 1955. Terremotos e vulcões de lava [foto 3] ceifaram milhares de vidas na Indonésia, enquanto novos tsunamis no Índico e no Pacífico fizeram centenas de mortos. Incêndios enormes devoraram plantações e bosques na Espanha, Portugal e EUA. Chuvas anormais inundaram a região da bacia do Danúbio, o norte da Alemanha, e causaram deslizamentos de terra mortíferos na Colômbia e na Ásia, enquanto secas históricas açoitaram a Espanha e a Austrália.

Esses e muitos outros dramas teriam outrora caracterizado um ano pesado em perdas. Mas em 2006 integraram uma “normalidade” profundamente perturbada.

Enquanto o Ocidente festejava, o Islã rezava para destruí-lo

Nas vésperas de 2005, uma imensa fratura tectônica movimentou-se e desencadeou o tsunami. Em 2006, inúmeras fraturas abertas na humanidade, sobretudo pela Revolução anticristã, multiplicaram as convulsões entre homens desnorteados pela avalanche de imoralidade, irracionalidade e caos revolucionário.

Durante a passagem do ano 2005-2006, uma multidão encheu os Champs Elysées em Paris para brindar e festejar. Em Meca, outra multidão rezava em torno da Kaaba os versos corânicos que prometem aos seguidores de Alá o domínio do mundo pela religião e pela cimitarra. O contraste das duas multidões pôs a nu uma das tantas fraturas na humanidade e deu uma das claves do que aconteceria no ano.

Iraque: o Islã faz explodir as divergências

Esse antagonismo apresentou no Iraque seu capítulo mais sangrento. O islamismo revolucionário recrutou sequazes de Maomé do mundo todo contra a coalizão liderada pelos EUA. Essa coalizão obteve resultados parciais notáveis embora a mídia ocidental tenha pouco falado deles e superdramatizado cada baixa havida entre os soldados dos EUA.

Em junho, com a eliminação de Abu Musab al-Zarqawi, chefe da Al-Qaeda, e a cúpula do seu movimento, ficou claro que este não venceria os EUA. Como saída, o fundamentalismo procurou excitar até o paroxismo o ódio latente entre as seitas que compõem o mundo islâmico e precipitar o Iraque numa guerra civil religiosa e étnica que os EUA não teriam meios de controlar [foto 4]. Vinganças mútuas de uma crueldade sem nome ensangüentam a história de sunitas e xiitas, duas seitas principais desde a divisão do Islã pela sucessão de Maomé, no século VI.

Al-Qaeda incentivou chacinas de membros das duas seitas, sacrificando milhares de simples populares, cuja morte a mídia usou para criticar os EUA. No fim do ano, a torcida midiática inclinava-se por uma saída dos EUA do Iraque, tão desastrosa e vergonhosa quanto foi a do Vietnã.

Tentativas de jogar o Líbano na guerra civil

A mesma técnica revolucionária de envenenar as divergências culturais e religiosas colocou o Líbano à beira da guerra civil. O estopim foi uma série de assassinatos que culminaram com o do ministro católico Pierre Gemayel [foto 5]. Grandes manifestações cristãs e muçulmanas, marcadas de ameaças recíprocas, reavivaram o fantasma da guerra civil.

Em agosto, soldados europeus desembarcaram no Líbano para garantir a frágil trégua entre Israel e o grupo terrorista Hezbollah, teledirigido pela Síria e pelo Irã. Um conflito civil no Líbano poria os países europeus numa alternativa análoga à dos EUA no Iraque: agir ou retirar-se. Agir implicaria guerra e mortes. Retirar-se significaria atrair a ofensiva islâmica por cima da Europa.

Após a reunião da Organização da Conferência Islâmica (OCI), magotes de fundamentalistas atacaram e incendiaram consulados e sedes de organizações ocidentais em cidades muçulmanas. O pretexto foram caricaturas de Maomé que haviam sido publicadas meses antes, na maior das indiferenças, na Dinamarca e no Egito.

Também foi pretexto para protestos teledirigidos o fato de S.S. Bento XVI ter citado em Regensburg (Alemanha) um imperador de Bizâncio do século XIV, que falara sobre a pregação da violência contida no Corão. Em posterior visita à Turquia, Bento XVI manifestou aprovação à entrada desse país na UE, elogiou o secularismo de Estado turco e orou numa mesquita voltado para Meca, o que parece ter contentado os fundamentalistas maometanos. Mas causou interrogações no Ocidente, levando a revista norte-americana “Time” a perguntar se a repentina inversão de posições do pontífice em Ancara e Istambul não teria empanado sua imagem de defensor rígido das posições católicas.(1)

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