Nossa Senhora do Rosário do Cabo
18/01/2005
Valdis Grinsteins
Essa
invocação da Padroeira do Canadá recorda-nos
a perseverança que devemos ter nas situações adversas desta vida e,
por meio de nossa fidelidade, atrair a bênção de Deus e a proteção
da Virgem Santíssima
A imagem
que a imensa maioria das pessoas tem do Canadá está ligada à neve, a um
intenso frio e muito gelo. De fato assim é, mas por vezes ocorre que, por
permissão de Deus, o clima pode mudar e resolver situações difíceis. O
que no Brasil poderia causar uma certa graça, entretanto foi, no caso concreto,
uma história muito real que começa em 1867.
Naquele
ano, a população da cidade de Cap-de-la-Madeleine era constituída apenas
por 1.300 pessoas. Iniciara-se uma renovação na piedade da população. O
pároco local, Pe. Désilets, criara uma confraria do Santo Rosário, na qual
rapidamente inscreveram-se muitas pessoas, não só da cidade, mas também
dos arredores, num total de 3.000 almas.
O
crescimento numérico de católicos praticantes representou, para o zeloso
sacerdote, um problema: era preciso construir uma igreja maior. A pequenina
igreja edificada em 1714 não comportava mais o número crescente de fiéis.
Mas, como fazê-lo? As pessoas da localidade não eram ricas, e, além do
mais, o terreno era muito arenoso, havendo pouca pedra. Afinal, uma decisão
foi tomada: construir-se-ia a nova igreja no início de 1879. Para isso,
era preciso trasladar as pedras que se podiam obter do outro lado do rio.
Transportá-las por barco seria muito custoso, e decidiu-se então que o
transporte seria efetuado no inverno, quando o rio ficasse congelado.
Entretanto,
justamente naquele ano o inverno fora muito menos rigoroso, e o rio não
congelara. Chegou o Natal, passou o Ano Novo, terminou janeiro... e nada.
Poder-se-ia ainda esperar, porque fevereiro também era um mês muito frio.
Mas nada de congelamento. Considerando a possibilidade de passar mais um
ano numa igreja apertada e sem condições para receber todos os fiéis, os
católicos começaram a rezar o Rosário na intenção de que o rio se congelasse.
Iniciou-se o mês de março, e ainda nada. Se no inverno o rio não se congelara
— pensariam os céticos –– dificilmente congelar-se-ia em março, início
da primavera. Mas os católicos não desistiram. Afinal, Nossa Senhora é Rainha,
e pode perfeitamente solucionar esses problemas.
A
ponte do Rosário
Altar com a imagem de
Na. Senhora do Rosário do Cabo, Padroeira do Canadá
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Em
meados de março, o Padre Désilets encontrava-se realmente preocupado. Não
pela piedade do povo, que se mantinha firme rezando o Rosário em conjunto
todos os domingos, mas por prever mais um ano em que permaneceriam em condições
precárias as atividades do culto na igrejinha. Devido a isso, ele fez uma
promessa a Nossa Senhora: caso a ponte de gelo se formasse, ele consagraria
a pequena igreja à Virgem Santíssima.
Ao
entardecer do dia 16 de março, o esperado prodígio ocorreu: o rio se congelou
e formou-se uma ponte de gelo de uns dois quilômetros, suficientemente
firme para permitir a passagem dos trenós carregados de pedras. Foi enviado
um aviso a todos os colaboradores, e entre os dias 19 e 25 de março uma
centena de trenós transportou todas as pedras necessárias para a construção
da nova igreja. Logo depois o clima mudou e a ponte de gelo — chamada pelos
católicos a ponte do Rosário — se desfez.
Satisfeitos
por verem a proteção de Nossa Senhora quanto à nova igreja, os fiéis começaram
com entusiasmo a construção. E no início do verão de 1880 ela estava pronta.
A cerimônia da bênção da igreja foi realizada pelo bispo de Trois Rivières,
Mons. Louis François Laflèche. A velha igreja foi poupada, e, curiosamente,
será esta a que atrairá multidões no futuro.
O milagre do olhar
Detalhe do altar da foto
acima
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Até aqui,
poder-se-ia dizer que a narração constitui a piedosa história de uma paróquia.
Nada de estranho que o virtuoso sacerdote cumpra sua promessa feita à Virgem
e lhe dedique a velha igrejinha, no dia 22 de junho de 1888. Ele tinha
preparado uma grande festa e convidado um renomado orador, o padre franciscano
Frederik Jansoone. Após a cerimônia, foi colocada no altar-mor uma imagem
de Nossa Senhora, que antes se encontrava num altar lateral da mesma igreja.
Assim, a pequena igreja de Santa Maria Madalena passava a chamar-se igreja
de Nossa Senhora do Santo Rosário.
Terminadas
as cerimônias de consagração da igreja, três pessoas ainda se encontravam
rezando no templo: o Pe. Désilets, o Pe. Jansoone e Pierre Lacroix, uma
pessoa portadora de deficiências físicas.(1)
De
repente, acontece um milagre, assim descrito pelo padre Jansoone: “A
imagem da Virgem, que tinha os olhos completamente baixos, abriu-os totalmente.
Seu olhar estava fixo, olhando adiante, bem em frente. Uma ilusão era
difícil, pois sua face encontrava-se plenamente batida pelos raios do sol,
que entravam por uma janela e iluminavam todo o santuário. Seus olhos eram
negros, bem formados e em plena harmonia com o rosto. O olhar da Virgem
era o de uma pessoa viva e tinha uma expressão de severidade misturada
com tristeza. Este prodígio durou entre cinco e dez minutos”.(2)
A
visão desse portento mudou totalmente a vida do Pe. Jansoone. Ele dedicou
desde então toda sua vida a propagar a devoção a Nossa Senhora do Rosário
do Cabo e foi o primeiro diretor das peregrinações, que duram até os dias
de hoje.
Lição: vida terrena é luta
Igreja antiga em Cap-de-la-Madeleine
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Algumas
pessoas, ao tomarem conhecimento desta narração, prestam muita atenção
no milagre dos olhos e se esquecem da ponte do Rosário. Parece-nos
mais simpático o que acontece, por assim dizer, sem esforço. Com efeito,
aquilo que é extraordinário chama naturalmente muito a atenção. O fato
de Nossa Senhora nos olhar, sem termos que fazer qualquer esforço, é admirável.
Mas rezar com perseverança, confiar quando o Céu parece fechado para nós,
acreditar quando tudo parece perdido, eis o que é difícil.
Tal
perseverança na desolação é o que atrai, de modo especial, as bênçãos de
Nossa Senhora. A vida real não é um filme de Hollywood, com soluções mágicas
e finais felizes. Não foi assim a vida de Nosso Senhor Jesus Cristo, e
não podemos esperar que a nossa o seja, pois “christianus alter Christus”
(o cristão é outro Cristo). A realidade da vida é o combate, conforme a
Igreja nos ensina: “Militia est vita hominis super Terram”.(3) Devemos,
pois, ficar contentes quando fatos extraordinários se produzem, mas devemos
sobretudo estar preparados para enfrentar com confiança, coragem e perseverança
todas as adversidades da vida. Eis uma importante lição que podemos tirar
da história da Padroeira do Canadá.
–––––––––
Notas:
1. http://www.patrimoine-religieux.qc.ca/pelerinage/pelerinage2f.htm
2. http://www.sanctuaire-ndc.ca/intro.html
3. Livro de Jó, 7, 1.
Veja:
http://www.catolicismo.com.br/
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