ROMA ETERNA Lembranças e lições de momentos inesquecíveis
23/05/2005
Mário Navarro da Costa Enviado especial
O
falecimento de S.S. João Paulo II e a eleição de S.S.
Bento XVI patentearam ante o mundo uma verdade fundamental: a Igreja Católica é o
centro de todo o acontecer humano.
Foto de satélite
da longa fila no Vaticano |
Roma –– No antigo cerimonial de entronização e coroação
dos Vigários de Cristo, um frade portava uma longa vara com a ponta
envolvida em estopa, ateava-lhe fogo e proclamava: “Pater sancte, sic
transit gloria mundi” (Santo Padre, assim passa a glória do mundo),
primeiro uma vez diante do Papa; depois, duas vezes no meio da Basílica;
por fim, três vezes em alta voz diante do altar de São Pedro,
e repentinamente apagava a chama. Pois, neste vale de lágrimas, a morte
vem até para o mais elevado de todos os homens em glória e honra,
que é o Papa.
Na noite, sob a garoa, a Basílica de São Pedro, toda iluminada,
como que tocava nas nuvens, oferecendo arrebatador espetáculo. O chão
de pedras da Praça brilhava de modo atraente, circundado pela famosa
colunata de Bernini. Ali, milhares de pessoas fixavam seus olhares no Palácio
Apostólico. Muitos rezavam. Todos compartilhavam a mesma apreensão:
S.S. João Paulo II, naquela noite de 1º para 2 de abril, preparava-se
para o momento solene entre todos, de comparecer ante o Criador.
Comoção leva 3 milhões à Praça de São
Pedro
Noite da morte
de João Paulo II: Vigília na Praça de São
Pedro |
A notícia
chegou só no dia seguinte, quando os sinos da Basílica
de São Pedro dobraram a finados. Ela suscitou no mundo — no
dizer irreverente de um diário parisiense — um “tsunami
de lágrimas
e água benta”. E o que eu testemunhei em Roma desde o dia 6
de abril foi um caudaloso afluxo de fiéis — 3 milhões,
segundo estimativas oficiais — a render as derradeiras homenagens ao
Pontífice.
A imensa fila demorava de 11 a 12 horas para conduzir o fiel ante o corpo
do Pontífice, revestido com paramentos cor púrpura, pálio
branco com cruzes negras, sandálias, luvas vermelhas e mitra dourada,
como estabelece o cerimonial pontifício.
Fiéis
rezando num altar da Basílica de São Pedro antes do
falecimento do Papa |
Estive muitas vezes antes na Basílica de São Pedro. Nela, como
em numerosas catedrais da Europa, a movimentação agitada do turismo
de massa prejudica com freqüência o recolhimento e a oração.
E jamais, como nesses dias, tantos romeiros visitaram a Basílica em
tão pouco tempo: entre 14.000 e 18.000 pessoas por hora! Entretanto,
o ambiente era recolhido e respeitoso. Muitos visitantes paravam para rezar
nos altares laterais, seriamente concentrados e até contritos, tocados
pela majestade das pompas pontifícias. Tudo muito diferente do turismo
convencional.
Homenagem dos grandes desta Terra
Dezenas de
monarcas, chefes de Estado e chefes de Governo |
Tal foi a comoção mundial, que o presidente da maior potência
da Terra — os EUA, onde as seitas protestantes somadas ainda constituem
maioria — junto com os dois presidentes que o precederam (Clinton e Bush
pai), foram oficialmente ajoelhar-se ante o catafalco de S.S. João Paulo
II. Normalmente os protestantes não se ajoelham — é um
dos legados do orgulho de Lutero... Mas eles o fizeram, após simples
indicação de um cerimoniário. A esposa do presidente George
W. Bush e a secretária de Estado americana, igualmente protestantes,
com a sensibilidade feminina para os ambientes, compreenderam logo a atitude
certa; e quem as visse poderia talvez imaginar que elas freqüentaram uma
boa escola católica de outrora. “Anima humana naturaliter christiana” (A
alma humana é naturalmente cristã), escreveu Tertuliano. “Anima
humana naturaliter catholica”, acrescentaríamos nós,
observando a cena.
À
s solenes exéquias do pranteado Pontífice assistiram 169 delegações
estrangeiras: nelas figuravam 10 monarcas, 59 chefes de Estado e 17 chefes
de Governo. Houve, é claro, ausências “compreensíveis”,
como, por exemplo, a da China comunista e a da Rússia de Putin, esta
que oculta cada vez menos seu retorno à ditadura soviética.
Multidão
assiste ao traslado do corpo de João Paulo II |
São Pedro Damião qualificou a morte de um Papa com uma expressão
forte, que ajuda a avaliar o acontecido: “Momento de terror para a humanidade".
E de fato o mundo inteiro parou quando tomou conhecimento dela, tal a sua importância.
Igreja Católica: centro do acontecer humano
No dia da inumação, junto aos representantes dos vários
países havia 157 cardeais, centenas de bispos, milhares de prelados
e sacerdotes, cerca de 500.000 fiéis na Praça de São Pedro
e adjacências, além de outros 600.000 que acompanhavam a cena
em telões instalados nas grandes praças de Roma.
Milhões
prestam uma última homenagem |
Analisando tal reunião sem precedentes de líderes da Terra, vinha à minha
memória o que eu ouvira tantas vezes do Prof. Plinio Corrêa de
Oliveira: a Igreja Católica é o centro da História. Todos
os acontecimentos do mundo giram em torno d'Ela, e por mais que os homens de
pouca fé não queiram reconhecê-lo, a humanidade toda, em
maior ou menor medida, pensa e age em função da Igreja, até quando
a vituperam ou fingem desconhecê-la.
Fracasso da pregação progressista
Passam-se os dias e vem o Conclave. Encontrava-me eu na Praça de São
Pedro quando saiu a fumaça branca da Capela Sistina. Pude constatar
a euforia da multidão ao se apresentar na célebre Loggia da Basílica
o recém-eleito Bento XVI. Ouvi os cânticos e brados de júbilo
numa profusão de línguas — uma cena inesquecível...
Para mim foi a 3ª “fumaça branca”, já que nos
dois Conclaves de 1978 estivera presente como enviado de Catolicismo.
Fumaça
branca, sinal da eleição do novo Papa |
Pensar que, há poucas décadas, em certos ambientes
progressistas católicos pregava-se que a Igreja do III milênio
seria “pobre” e
teria retornado aos seus “primórdios catacumbais”, reduzida
a pequenas comunidades despojadas e desestruturadas! O Vaticano renunciaria
aos seus palácios, templos e tesouros — depois de 20 séculos
de Tradição — e o Papa iria morar num apartamento ou paróquia
da periferia de Roma. A Igreja, diziam esses adeptos do “miserabilismo”,
faria isso para atender à sede de modernidade que grassaria entre os
fiéis, os quais já não compreendem mais uma Igreja hierárquica,
com suas pompas e cerimônias multisseculares, seus dogmas e preceitos
morais, suas vestes litúrgicas, bem como os hábitos sacrais de
clérigos e religiosas.
As multidões que vi em Roma ofereceram soberbo desmentido a tais pregações
visceralmente contrárias à prática e ao Magistério
tradicionais da Igreja. O imenso afluxo de pessoas patenteou eloqüentemente
que as propensões de alma dos fiéis rumam em sentido oposto àquele
ambicionado pelo chamado progressismo.
A pompa da Igreja atrai as multidões
Saudação
de S.S. Bento XVI após a eleição |
Nestes acontecimentos, ficou claro que a Rocha de Pedro — sobre a qual
sempre se apoiou a Igreja em meio ao caos universal, às trevas e ao
pecado — bem como a nobre estrutura austera e hierárquica da Igreja
Católica e sua pompa, que representa de antemão os fastos da
vida eterna, suscitam ondas de entusiasmo em todo o orbe. Ao invés de
afugentar, atraem as multidões.
Deixei Roma dominado pela certeza — não só de fé,
que já possuía, mas também certeza sensível — de
que por mais gigantescas que sejam as tempestades que possam se desencadear
sobre a santa Igreja, nada conseguirá destruí-la. Seus adversários
acabarão se dissipando como fumaça ao vento, ainda que seja em
meio aos terríveis castigos anunciados por Nossa Senhora em Fátima.
Veja:
http://www.catolicismo.com.br/
|