Princesa Isabel marcante personagem na História do Brasil
16/05/2006
Dom Luiz de Orleans e Bragança
Apesar de tudo, continua a detração contra a monarquia
Leão XIII |
O Papa Leão XIII resolveu premiar a Princesa Isabel com a maior distinção
que os Soberanos Pontífices davam a chefes de Estado e a pessoas de
grande relevo, nas ocasiões em que adquiriam méritos especiais.
Enviou-lhe a Rosa de Ouro, que foi entregue a 28 de setembro de 1888, no 17o
aniversário da promulgação da Lei do Ventre Livre. A data
foi escolhida pelo próprio Núncio Apostólico, para a cerimônia
que se realizou com toda magnificência na capela imperial. Entretanto,
apesar de tudo, continuou a campanha de detração contra a monarquia,
agora dirigida especialmente contra o Imperador: o velho está gagá;
ele dorme o tempo todo; o Conde d’Eu e a Princesa Isabel vão se
tornar tiranos aqui. Uma série de calúnias foi espalhada por
todo o País.
A 15 de novembro, os militares que
estavam no Rio de Janeiro — eram
minoria, representavam um terço do Exército brasileiro — proclamaram
a República. O golpe foi totalmente alheio à vontade do povo.
Tanto que os republicanos embarcaram a Família Imperial rumo ao exílio, à noite,
para que não houvesse reação popular. Na partida, a Princesa
Isabel passando junto à mesa onde havia assinado a Lei Áurea,
bateu nela o punho fechado e disse: “Mil tronos houvera, mil tronos eu
sacrificaria para libertar a raça negra”.
D. Pedro II recusou 5 mil contos
de réis — cerca de 4 toneladas
e meia de ouro, uma fortuna — que lhe ofereceram os revoltosos, porque,
dizia, o novo governo não tinha direito de dispor assim dos bens nacionais.
Da. Teresa Cristina, mal chegando a Portugal, morreu de desgosto no Grande
Hotel do Porto. Eu lá estive há alguns anos, quando o hotel inaugurou
uma placa em memória dela. E D. Pedro II faleceu a 4 de dezembro de
1891, no Hotel Bedfor, em Paris, onde uma placa recorda o passamento do ilustre
hóspede. Tal era o prestígio que cercava sua pessoa, que a República
francesa concedeu-lhe funerais completos de Chefe de Estado.
Uma rainha, uma fada
com a bondade brasileira |
Conde d’Eu possuía um castelo na Normandia, mas ele e a Princesa
Isabel compraram um palacete em Boulogne-sur-Seine, que é um nobre bairro
periférico de Paris. Lá ela abria seus salões para os
brasileiros que iam visitá-los. E não só isso. Conseguiu
se impor na sociedade parisiense a tal ponto, que várias memórias
de personalidades da época a apresentam quase como uma rainha daquela
sociedade. Era tida mesmo como a principal personagem. Somente ela e o presidente
da República podiam entrar de carruagem no pátio interno da Ópera
de Paris.
Uma hindu, que se tornaria mais
tarde Maharani de Karputhala, escreve em suas memórias que ela via a Princesa Isabel como uma verdadeira rainha, uma
fada. Não só isso — rainha e fada — mas também
com toda a bondade brasileira e católica, característica da Princesa
Isabel. A Maharani narra que, quando menina, de passagem pela capital francesa,
teve uma crise aguda de apendicite. Operada com os recursos incipientes da época,
passou longa convalescença no hospital. A sociedade parisiense toda,
curiosa, ia visitá-la. Ela dizia que se sentia um bichinho exótico,
que as pessoas iam vê-la como num zoológico. E a única
que foi visitá-la com bondade e para lhe fazer bem foi a Princesa Isabel.
Ela conta que minha bisavó aproximou-se do seu leito, agradou-a muito,
acariciou-a e consolou-a. E no fim, disse: “Minha filha, eu não
sei que religião você tem. Mas sei que há um Deus que ama
todas as crianças do mundo. Aqui está uma imagem da mãe
d’Ele. Guarde-a consigo, e quando você estiver numa grande aflição,
peça a Ela para interceder junto ao seu Filho”. Infelizmente a
Maharani não se converteu à Igreja Católica, permaneceu
pagã até o fim da vida, mas nos momentos de apuro ajoelhava-se
diante da imagem de Nossa Senhora, que a Princesa Isabel tinha lhe dado. Porque
sabia que seria atendida.
Santos Dumont, testemunha da bondade da Princesa
Santos Dumont voa
no 14 Bis |
Santos Dumont, nessa época, realizava suas experiências em Paris.
Sabendo que ele passava muito tempo no campo onde fazia seus experimentos,
a princesa mandava-lhe farnéis a fim de que ele não precisasse
voltar à cidade para almoçar. Certa vez, escreveu-lhe: “Sr.
Santos Dumont, envio-lhe uma medalha de São Bento, que protege contra
acidentes. Aceite-a e use-a na corrente de seu relógio, na sua carteira
ou no seu pescoço. Ofereço-a pensando em sua boa mãe,
e pedindo a Deus que o socorra sempre e ajude a trabalhar para a glória
de nossa Pátria. Isabel, Condessa d’Eu”. Santos Dumont usou
a medalha por toda a vida. E noutra ocasião disse-lhe: “Suas evoluções
aéreas fazem-me recordar nossos grandes pássaros do Brasil. Oxalá possa
o Sr. tirar de seu propulsor o partido que aqueles tiram de suas próprias
asas, e triunfar para a glória de nossa querida Pátria”.
Muito tocante também é o fim da carta que ela escreveu ao Diretório
Monárquico para anunciar os casamentos de seus filhos mais velhos. O
Diretório era composto pelo Conselheiro João Alfredo Corrêa
de Oliveira, pelo Visconde de Ouro Preto e pelo Conselheiro Lafayette de Oliveira.
A carta é datada de 9 de setembro de 1908: “Minhas forças
não são o que eram, mas o meu coração é o
mesmo para amar a minha Pátria e todos aqueles que lhe são dedicados.
Toda a minha amizade e confiança”. Era o jeito brasileiro, a bondade
brasileira perfeitamente encarnada naquela nobre dama.
Mesmo longe do Brasil, tudo fazia
para engrandecer o País
Princesa Isabel e o Conde d’Eu com seu neto Dom Pedro Henrique |
Outra amostra de seu profundo
interesse pelo Brasil está registrada
numa carta ao Cons. João Alfredo. O Banco do Brasil –– não
me recordo em que mandato presidencial ocorreu o fato –– estava
num descalabro republicano: desordem total, contas que não estavam acertadas,
funcionalismo completamente rebelde. E o presidente da República de
então concluiu que o único que teria inteligência, força,
garra e pulso para pôr ordem naquela situação seria o Cons.
João Alfredo, e o convidou a assumir a presidência do Banco do
Brasil. João Alfredo respondeu: “Eu sou monarquista, e portanto
só posso aceitar esse cargo se a minha Imperatriz autorizar”.
Escreveu à Princesa Isabel, explicando o caso. E ela respondeu-lhe: “Para
o bem de nossa Pátria, o Sr. deve aceitar”. João Alfredo
assumiu a presidência do Banco do Brasil, pôs em ordem o funcionalismo
e acertou a contabilidade. Pagou todos os atrasados, todas as dívidas,
deixando tudo em perfeito estado. Depois pediu demissão e morreu pobre,
pois não recebeu nada por aquela importante gestão.
Em carta à irmã de um monarquista eleito deputado, Ricardo Gumbleton,
de tradicional família paulista, o qual não queria aceitar o
cargo de deputado, a Princesa observa: “Não concordo, absolutamente!
Diga a seu irmão que ele deve aceitar a cadeira de deputado e propugnar
pela grandeza moral, econômica e social de nossa Pátria. Não
aceitando é que ele estará procedendo de maneira contrária
aos interesses da coletividade. Não nos deve importar o regime político
sob o qual esteja o Brasil, mas sim conseguir-se colaboradores de boa vontade
capazes de elevar o nosso País. De homens como ele é que o Brasil
precisa para ascender mais, para fortalecer-se mais. Faça-lhe sentir
que reprovo sua recusa”.(6) Esse fato revela uma vez mais que ela procurava
colocar o bem do Brasil acima dos próprios interesses.
Na França, representou o
que havia de melhor do Brasil
Em
março de 1920, após as exéquias de seu filho Dom
Luiz, vemos a Princesa Isabel (à frente, no grupo da esquerda) |
Ela ainda viveu até 1921. Cada vez mais fraca, mas conservando sempre
aquela grande classe, aquele grande porte que a caracterizava. Em suas fotografias
no exílio, ela mantém um porte imperial que não apresentava
aqui no Brasil. No infortúnio, a noção da sua missão
foi se cristalizando cada vez mais. E realmente, nessas fotografias, sua atitude
era de uma imperatriz. No batizado de meu pai, ela manifesta uma nobreza e
uma categoria impressionantes. E foi assim até o fim da vida.
Morreu sem poder voltar ao Brasil.
Representou na França o que havia
de melhor do Brasil. Muito mais do que nosso corpo diplomático, muito
mais do que nossos homens de negócio, ela foi um exemplo do que o Brasil
era ou deveria ser. E a França entendeu isso. Assis Chateaubriand escreveu,
em Juiz de Fora, a 28 de julho de 1934: “Apagada a sua estrela política,
depois de vencida a tormenta da abolição, ela não tinha
expressão dura, uma palavra amarga para julgar um fato ou um homem do
Brasil. No mais secreto de seu coração, só lhe encontrávamos
a indulgência e a bondade. Este espírito de conduta, esse desprendimento
das paixões em que se viu envolvida, era a maior prova de fidelidade,
no exílio, à pátria distante. Mais de 30 anos de separação
forçada não macularam a alvura dessa tradição de
tolerância, de anistia aos agravos do passado, que ela herdara do trono
paterno. [...] Foi no exílio que ela deu toda a medida da majestade
e da magnanimidade do seu coração. [...] Ela viveu no desterro
[...] como a afirmação de Pátria, acima dos partidos e
dos regimes. Debaixo da sua meiguice, da sua adorável simplicidade,
quanta fortaleza de caráter, quanto heroísmo, quantas obras valorosas”.(7)
Faleceu no castelo d’Eu. Apagou-se suave e docemente. A República
reconheceu o que o Brasil tinha perdido. O presidente Epitácio Pessoa
determinou três dias de luto nacional, e que fossem celebradas exéquias
de Chefe de Estado. Também a Câmara Federal votou que seu corpo
fosse trazido para o Brasil num vaso de guerra, o que só se realizou
em 1953. Em 13 de maio de 1971, seu corpo e o do Conde d’Eu foram transladados
solenemente à catedral de Petrópolis, e lá repousam à espera
da ressurreição dos mortos e do Juízo final.
Essa foi a insigne mulher que nosso
Brasil registra em sua história.
Ela não foi uma intelectual. Foi princesa e patriota até o fundo
da alma. Uma senhora que tinha consciência de ter nascido para o bem
de um País. E encarnou essa missão na Pátria e no exílio
até o fim de sua existência. Foi um modelo de princesa, de imperatriz
e de católica. Ela foi o tipo perfeito de grande dama brasileira.
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Notas:
1. Hermes Vieira, Princesa
Isabel – Uma Vida de Luzes e de Sombras,
Editora Novos Ensaios Brasileiros, São Paulo, 1989, p. 19.
2. Idem, p. 44.
3. Idem, p. 168.
4. Idem, p. 161.
5. Hermes Vieira, op. cit., pp. 163 e 164, citando Heitor Lyra.
6. Idem, p. 234.
7. O Culto a Isabel, “Diário de São Paulo”,
29-7-1934, citado na obra acima indicada de Hermes Vieira, pp. 232-233.
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Veja:
http://www.catolicismo.com.br/
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