Como nasceu a providencial obra Revolução e Contra-Revolução


14/10/2009

Caio Vidigal Xavier da Silveira

Interação entre protestantismo e comunismo


“Rios nascidos em uma mesma fonte, o protestantismo...
Paralelamente a isso, formava-se nele também uma noção cada vez mais clara das etapas que a Revolução havia atravessado (protestantismo, Revolução Francesa, comunismo), bem como de seu caráter satânico. Ao comentar uma nota de imprensa que noticiava a adesão de um pastor protestante alemão ao partido comunista, escreveu:

“Cristão a princípio, teve no entanto o livre exame protestante uma conseqüência imediata: fez nascer, ao lado das confissões reformistas, uma forte corrente racionalista que, através do deísmo de Voltaire, atingiu o ateísmo total de Rousseau.

 “Este, estendendo as aplicações práticas de seus princípios ao campo da organização política e social, determinou a sangrenta explosão de 1789. E com esta Revolução triunfaram as idéias igualitárias, destruindo totalmente a hierarquia na organização política e sabotando-a seriamente na organização social.


... e o comunismo convergem para os mesmos fins, desembocando ambos no abismo do materialismo absoluto”
“Daí por diante, um movimento foi estendendo a aplicação dos princípios igualitários às questões econômicas: surgiu o comunismo.

 “Eis, em rápidos traços, a genealogia que estabelece um parentesco muito estreito entre o protestantismo e o comunismo. Rios nascidos em uma mesma fonte, convergem para os mesmos fins, desembocando ambos no abismo do materialismo absoluto” (“O Legionário”, nº 90, 22-11-31 –– Babel Protestante).


Ambientes, imagem e semelhança dos homens

 

Um dos aspectos mais originais do pensamento de Dr. Plinio, que foi amadurecendo aos poucos e do qual se encontram fragmentos em publicações, é a importância que ele dava às tendências e aos ambientes no processo revolucionário.

Pelos relatos que fez dos primeiros anos de sua vida, sabemos que era muito sensível aos imponderáveis dos ambientes, e percebia com perspicácia a influência que eles exerciam sobre aqueles que os compunham ou que deles participavam. Sabemos também que, como reação ao racionalismo, interessou-se pelos escritos do romancista Marcel Proust, que brilhava precisamente por suas descrições de ambientes.

Mais tarde, entusiasmou-se pela literatura de J.K. Huysmans (escritor francês convertido do satanismo ao catolicismo), que se distinguia principalmente pela arte de descrever os imponderáveis que emanavam dos ambientes da Igreja Católica.

Eis, por exemplo, um trecho de artigo de “O Legionário”, em 1932:

“Sob o ponto de vista estritamente religioso, interessava principalmente o novo gênero de apologética que Huysmans tentou instituir. [...] Huysmans faz da Igreja uma descrição material objetiva, através da qual procura fazer ressaltar, com inimitável habilidade, os lampejos de sobrenaturalidade que se desprendem da liturgia magnífica, enriquecida por um simbolismo comovedor, do cantochão estupendo, nas sua imprecações veementes, no tumultuar de suas contrições, na explosão de seus surtos de confiança na Providência Divina, no lacrimejar harmonioso de seus ofícios de defuntos” (“O Legionário”, nº 94, 21-2-32, Huysmans [II] En Route).

Em seu interesse por Huysmans, observamos já os germens do que ele acentuaria mais tarde: a idéia de que “os homens formam para si ambientes à sua imagem e semelhança, ambientes em que se espelham seus costumes e sua civilização. Mas a recíproca também é verdadeira em larga medida: os ambientes formam à sua imagem e semelhança os homens, os costumes, as civilizações”. Este princípio foi extraído de um artigo publicado mais de cinco anos antes do lançamento da R-CR (Catolicismo nº 37, janeiro/1954 –– Sede prudentes como as serpentes e simples como as pombas).

“Idéias não são roupas que se vestem ou se despem”

O princípio segundo o qual os ambientes modificam as convicções dos homens é aplicado ao carnaval em outro artigo de “O Legionário”, no qual comenta os seus efeitos sobre as pessoas que dele participam. Notem os leitores que Dr. Plinio fala do carnaval dos anos 40, bem menos sensual que o de hoje, mas que também era pernicioso:

“Há uma regra de moral que afirma: ‘nada de péssimo se faz subitamente’. É contra todas as regras da psicologia humana supor que pessoas muito dignas, muito moralizadas, muito sensatas, conseguem depor inteiramente as suas idéias durante os três dias do carnaval, e depois repô-las intactas, imaculadas, inteiriças, após os festejos de Momo.

“Idéias não são roupas que se vestem ou se despem.

“Se alguém procede, durante o carnaval, de modo extremamente leviano, é isto prova de que anteriormente há uma falha na couraça moral dessa pessoa. Por outro lado, se essa pode ter ocasionado a renúncia momentânea a certas atitudes e a certas idéias durante o carnaval, como é difícil voltar, depois, à primitiva linha de moral!” (“O Legionário” nº 492, 15-2-42 –– Pearl Harbour e o Carnaval).

Salvação do mundo: recorrer à seiva do catolicismo

Paralelamente ao aprofundamento de seu pensamento concernente à Revolução, Dr. Plinio avançava também sua reflexão sobre a Contra-Revolução. A primeira conclusão que tirou dessa reflexão foi que a força-motriz da Contra-Revolução é a graça divina distribuída pela Igreja Católica, e que de nada adiantaria uma ação política sem uma conversão religiosa da humanidade:

 “Comunismo ou catolicismo, eis o dilema a que não se pode fugir. Ou a dissolução continua sua marcha, e nos arrasta ao comunismo pelo apodrecimento de toda a organização política e social do País, ou voltamos atrás e –– recorrendo à seiva do catolicismo, que já uma vez salvou uma civilização que também estava podre –– pomos Deus nas escolas, nas constituições, nos lares, nos clubes e principalmente nos caracteres” (“O Legionário” nº 79, 10-5-31 – O triunfo de Cristo-Rei nas escolas).

A segunda conclusão era que esta Contra-Revolução devia ser radical:

“O mundo não pode ser salvo por formas diluídas de cristianismo, ou por sistemas que representem uma etapa comodista ou preguiçosa nas sendas da restauração da Cristandade. Nosso leitmotiv deve ser o de que, para a ordem temporal do Ocidente, fora da Igreja não há salvação. Civilização católica, apostólica, romana, totalmente tal, absolutamente tal, minuciosamente tal, é o que devemos desejar. A falência dos ideais políticos, sociais ou culturais intermediários está patente. Não se pára no caminho de volta para Deus: parar é retrogradar, parar é fazer o jogo da confusão. Nós só queremos uma coisa: o catolicismo completo” (“O Legionário”, 13-5-45 –– A grande experiência de 10 anos de luta).

Formação de um movimento contra-revolucionário

Podemos certamente datar da metade dos anos 40 –– portanto, pouco após a publicação do primeiro livro de Plinio Corrêa de Oliveira, Em Defesa da Ação Católica –– o período em que o autor já tinha explicitado todas as idéias-mestras da R-CR.

Se me detive na minuciosa descrição desses antecedentes, um tanto distantes, das idéias-mestras da R-CR, é para que os leitores sentissem quanto é verdadeiro o que está exposto no início: a) de um lado, R-CR é a mais bem acabada síntese de um pensamento que vinha de muito longe; e b) de outro, este pensamento é, em termos abstratos, a explicitação da posição que Dr. Plinio teve que tomar instintivamente diante da Revolução com a qual se confrontou desde a mais tenra idade.

Contudo, estou certo de que a curiosidade dos leitores não se limita a conhecer tais antecedentes distantes, e gostariam também de saber como se deu a redação de R-CR. Não foi como no alto do Monte Sinai, em meio a clarões e tempestades, pois não foi esse o procedimento habitual da Divina Providência com relação a Dr. Plinio.

Para começar, o livro foi escrito tranqüila e modestamente, com a finalidade de responder às circunstâncias rotineiras de seu apostolado contra-revolucionário. Em breves palavras, a redação está ligada às viagens que Dr. Plinio fez à Europa em 1950 e 1952. Durante essas curtas estadias, encontrou movimentos e intelectuais, o que havia de mais contra-revolucionário ou menos daquele lado do Atlântico. Além disso, é preciso salientar que um de seus objetivos era encontrar um líder a quem pudesse confiar seu próprio pequeno grupo. Líder que, para ele, à vista da nobreza da Contra-Revolução, só podia ser um príncipe da Igreja  (um Cardeal, por exemplo) ou um príncipe de uma grande dinastia européia. Nessas curtas viagens, percebeu entretanto que todos esses movimentos — quer fossem de natureza religiosa, reagindo contra os erros do progressismo, ou de natureza temporal, combatendo o comunismo e o socialismo — tinham uma visão parcial e incompleta da Revolução, e muitas vezes uma visão deformada pelos erros do que ele denominaria mais tarde “falsa direita”.

Ao mesmo tempo, deu-se conta de que seus interlocutores europeus olhavam-no um pouco de cima para baixo, como que de um pedestal (eles representavam o Velho Mundo culto, e Dr. Plinio o Novo Mundo; exibiam uma genealogia que remontava aos ultramontanos do século XIX, enquanto o pequeno movimento brasileiro parecia ter nascido ontem; e assim por diante). A fim de vencer as reticências, e colaborar visando um trabalho comum, faltava-lhe um “cartão de visita” prestigioso, apesar da sua condição de professor titular de uma cátedra na Universidade Católica de São Paulo.

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Veja:
http://www.catolicismo.com.br/materia/materia.cfm/

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