Os três tsunamis


23/01/2005

Boletim Eletrônico

São Paulo  22  de janeiro de 2005

Um espantoso tsunami (onda gigante)  estarreceu o mundo dia 26 de dezembro, matando em poucos minutos perto de 227.000 pessoas de diversas nacionalidades em países muito distantes uns dos outros. Desencadeou uma onda de ajuda humanitária nunca vista na história contemporânea. Como tem se comportado o homem diante dessa tragédia?

Os três tsunamis

O tsunami da Providência

Desde a mais remota antiguidade os homens se acostumaram a interpretar as grandes tragédias como uma interferência de Deus nos caminhos da humanidade para adverti-la. Bossuet, o célebre orador sacro francês do século XVII lembrava aos homens que "Dieu les frappe pour nous avertir" – Deus os atinge para nos chamar a atenção. Misericordiosamente, pois estamos no descaminho. Aquele inferno dantesco que em poucos minutos varreu diversos paraísos turísticos levando consigo a destruição e para a morte milhares de pessoas, passou a pesar na consciência da humanidade como um alerta. Será que ela ouvirá o apelo de Deus? Ou fará de conta que não é com ela! 227.000! Deus os levou para nos advertir! Que grande advertência!

O tsunami da vaidade e do oportunismo

Um sociólogo americano falecido há pouco tempo, Christopher Lash ("A rebelião das elites"), analisando as elites  de seu país, dizia que elas abdicaram ao seu papel histórico, apresentando hoje todos os vícios da antiga nobreza e nenhuma de suas virtudes. Frias, elas procuram somente mandar em todo o dinheiro e manter o controle de todas as obras assistenciais, longe do espírito da caridade e dos princípios básicos da civilização cristã ocidental.  A proliferação das ONGs arrecadando dinheiro para todo tipo de ações ditas sociais é uma prova das afirmações de Lash.

O que se viu nos últimos dias foi uma nunca vista feira de vaidades e oportunismo, onde Governos entraram em competição para ver quem oferecia mais doações -a repetir-se episódios semelhantes passados teme-se que muitos dos bilhões prometidos não se confirmarão ou ficarão retidos nas malhas da corrupção - ONGs batendo cabeça com governos, atabalhoadamente, correndo para ver quem chega primeiro, sem saber mesmo o que fazer ou onde atuar, voluntários sinceros sem serem aproveitados pois estão fora do  esquema. Foi patético o noticiário dos jornais.

O tsunami do cinismo e do deboche

Nada se compara entretanto ao cinismo e ao deboche da Via Campesina, ONG especialista em promover a Reforma Agrária em todo o mundo, arrecadando milhões e milhões para esse fim , bem como para financiar as estrepolias de José Bové. Está ela mobilizando as 70 organizações da Via Campesina em todo o mundo para arrecadar fundos para além da solidariedade, promover uma mobilização política no sentido de ajudar as comunidades locais na luta por direitos e autonomia. " A filosofia de auxilio da Via Campesina é que nossas comunidades devem participar diretamente e ser (sic) os atores do processo de reconstrução, conferindo 'as organizações camponesas e de pescadores o papel de coordenação na mobilização e no apoio. (...) O êxito dos auxílios locais e organizados autonomamente pela sociedade civil local em desastres anteriores na América Latina, na África e na Ásia, em contraste com os desmobilizadores e ineficientes programas impostos pelos governos, marcaram momentos cruciais no desenvolvimento de movimentos sociais em que os marginalizados assumem o controle de suas próprias vidas".

E se não for assim?

" Se isso não ocorrer, podemos nos preparar para a onda expansiva de uma tsunami social, com outros (sic) centenas de milhões de vítimas de doenças e da fome, e dezenas de milhares de pessoas obrigadas a migrar" .

Pode haver maior cinismo diante de tão grande tragédia? Tentar ideologizar a tragédia, reflete no mínimo, um non-sense, uma falta de sensibilidade moral diante da fatalidade que se abateu sobre seus semelhantes, só concebível mesmo por cérebros desviados como são os dos mentores da Via Campesina e seus aliados como o MST e congêneres.

O comportamento do mundo face ‘a advertência da Providência não nos leva à indagação perplexa se ela foi suficiente? Quem viver verá.

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