Em Recife, tentativa de quebrar a barreira psicológica contra o aborto


08/04/2009

Frederico R. de Abranches Viotti


Dom José Cardoso Sobrinho, Arcebispo Metropolitano de Olinda e Recife

Em todas as recentes pesquisas de opinião, os brasileiros têm se manifestado majoritariamente contrários ao assassinato de crianças no seio materno. Algumas pesquisas chegaram a dar 90% de respostas contrárias ao aborto.

Diante desse fato, os defensores do aborto estavam com poucas possibilidades de conseguir a aprovação legal desse ato, considerado crime pela lei dos homens e abominável pela Lei de Deus, estando incluído pelo Catecismo Romano entre os que “bradam aos Céus e clamam a Deus por vingança”.

Todavia, um acontecimento recente — com grande carga emocional — fez com que o debate sobre o aborto fosse reaberto.

O caso

Foi amplamente noticiado pela imprensa nacional e internacional o caso ocorrido em Alagoinha e Recife (PE), onde uma menor de nove anos de idade, violentada por seu padrasto, ficou grávida de gêmeos. Os meios de comunicação não deram ao caso uma cobertura jornalística isenta, limitando-se a explorar a situação emocional que dela decorreu.

Após a realização do aborto na menor, os jornais começaram a divulgar que S. Exa. Revma., o Arcebispo de Recife D. José Cardoso Sobrinho, tinha excomungado a mãe da menina e os médicos que participaram do aborto. Surgiram opiniões contraditórias, até mesmo entre o clero no Brasil e no próprio Vaticano, sobre o cabimento ou não da penalidade de excomunhão.    

Na realidade, D. José Cardoso Sobrinho apenas tinha alertado sobre a pena de excomunhão prevista no Código de Direito Canônico (a lei da Igreja) antes de o aborto ter sido praticado. Ele concedeu essa entrevista no dia 3 de março, sendo que o aborto foi realizado no dia 4 (Vide relato “Grávida de gêmeos”, no box abaixo).

 

Grávida de gêmeos em Alagoinha (PE)
O lado que a imprensa deixou de contar

Excertos do relatório elaborado pelo Pe. Edson Rodrigues, pároco de Alagoinha (PE), redigido anteriormente à Nota da Arquidiocese de Olinda e Recife, mas que serve como complemento dela, ao apresentar uma visão objetiva e integral do ocorrido

No dia 25 de fevereiro, nossa cidade foi tomada de surpresa por uma trágica notícia de um acontecimento que chocou o País: uma menina de nove anos de idade, tendo sofrido violência sexual por parte de seu padrasto, engravidou de dois gêmeos. [...]

O Conselho Tutelar de Alagoinha tomou as devidas providências. Na sexta-feira, dia 27 de fevereiro, levou as crianças ao IML de Caruaru-PE e depois ao IMIP (Instituto Médico Infantil de Pernambuco), de Recife, a fim de serem submetidas a exames. Chegando ao IMIP, em contato com a assistente social Karolina Rodrigues, a conselheira tutelar Maria José Gomes foi convidada a assinar um termo, em nome do Conselho Tutelar, que autorizava o aborto. Frente à sua consciência cristã, a conselheira negou-se diante da assistente a cometer tal ato. Foi então quando recebeu das mãos da assistente Karolina um pedido escrito que solicitava um “encaminhamento ao Conselho Tutelar de Alagoinha” [...] Os cinco conselheiros enviaram ao IMIP um parecer contrário ao aborto. [...]

No sábado, dia 28, fui convidado a acompanhar o Conselho Tutelar até o IMIP em Recife, onde, junto com a conselheira Maria José Gomes e mais dois membros de nossa paróquia, fomos visitar a menina e sua mãe. Chegamos ao IMIP por volta das 15 horas. Subimos ao 4º andar, onde estavam a menina e sua mãe em apartamento isolado. O acesso ao apartamento era restrito, necessitando de autorização especial. [...]

Com a proibição de acesso ao apartamento onde a menina estava, me encontrei com a mãe da criança ali mesmo no corredor. Profunda e visivelmente abalada com o fato, expôs para mim que tinha assinado “alguns papéis por lá”. A mãe é analfabeta e não assina sequer o nome, tendo sido chamada a pôr as suas impressões digitais nos citados documentos.

Perguntei a ela sobre o seu pensamento a respeito do aborto. Valendo-se de um sentimento materno marcado por preocupação extrema com a filha, ela me disse da sua posição desfavorável à realização do aborto. [...] Saímos do IMIP com a firme convicção de que a mãe da menina se mostrava totalmente desfavorável ao aborto dos seus netos.

Na segunda-feira, retornamos ao hospital. Ao chegarmos, eu e mais dois conselheiros tutelares, fomos autorizados a subir ao 4º andar, onde estava a menina. Tomamos o elevador, e quando chegamos ao 1º andar, um funcionário do IMIP interrompeu nossa subida e pediu que deixássemos o elevador e fôssemos à sala da assistente social em outro prédio. Chegando lá, fomos recebidos por uma jovem assistente social chamada Karolina Rodrigues. Entramos em sua sala eu, Maria José Gomes e Hélio, conselheiros de Alagoinha, Jeanne Oliveira, conselheira de Recife, e o pai [biológico] da menina, o Sr. Erivaldo, que foi conosco para visitar a sua filha, com uma posição totalmente contrária à realização do aborto dos seus netos. [...]

Perguntamos sobre a situação da menina como estava. Ela nos afirmou que tudo já estava resolvido e que, com base no consentimento assinado pela mãe da criança em prol do aborto, os procedimentos médicos deveriam ser tomados pelo IMIP dentro de poucos dias. Sem compreender bem do que se tratava, questionei a assistente no sentido de encontrar bases legais e fundamentos para isto. Ela, embora não sendo médica, nos apresentou um quadro clínico da criança bastante difícil, segundo ela, com base em pareceres médicos, ainda que nada nos tivesse sido apresentado por escrito.

Justificou-se com base em leis e disse que se tratava de salvar apenas uma criança, quando rebatemos a idéia alegando que se tratava de três vidas. Ela, desconsiderando totalmente a vida dos fetos, chegou a chamá-los de “embriões” e que aquilo teria que ser retirado para salvar a vida da criança. Até então ela não sabia que o pai da criança estava ali sentado ao seu lado. Quando o apresentamos, ela perguntou ao pai, o Sr. Erivaldo, se ele queria falar com ela. Ele assim aceitou. Então a assistente nos pediu que saíssemos todos de sua sala e os deixassem a sós para essa conversa. Depois de cerca de vinte e cinco minutos, saíram os dois da sala para que o pai pudesse visitar a sua filha. No caminho entre a sala da assistente e o prédio onde estava o apartamento da menina, conversei com o pai e ele me afirmou que sua idéia desfavorável ao aborto agora seria diferente, porque “a moça me disse que minha filha vai morrer e, se é de ela morrer, é melhor tirar as crianças”; afirmou o pai quase que em surdina para mim, uma vez que, a partir da saída da sala, a assistente fez de tudo para que não nos aproximássemos do pai e conversássemos com ele. Ela subiu ao 4º andar sozinha com ele e pediu que eu e os conselheiros esperássemos no térreo. Passou-se um bom tempo. Eles desceram e retornamos à sala da assistente social. O silêncio de que havia algo estranho no ar me incomodava bastante. Desta vez não tive acesso à sala.

Porém, em conversa com os conselheiros e o pai, a assistente social Karolina Rodrigues reclamou da conselheira [Maria José Gomes], porque esta tinha me permitido ver a folha de papel na qual ela [Karolina] solicitara o parecer do Conselho Tutelar de Alagoinha; [e como este negou o aborto, ela] rasgou a folha na frente dos conselheiros e do pai da menina. [...]

Durante todo o tempo de permanência no IMIP, não tivemos contato com nenhum médico. Tudo o que sabíamos a respeito do quadro da menina era apenas fruto de informações fornecidas pela assistente social. [...]

Dada a repercussão do fato, surge um novo capítulo na história. O Arcebispo Metropolitano de Olinda e Recife, Dom José Cardoso, e o bispo de nossa Diocese de Pesqueira, Dom Francisco Biasin, sentiram-se impelidos a rever o fato, dada a forma como ele se fez. Dom José Cardoso convocou, portanto, uma equipe de médicos, advogados, psicólogos, juristas e profissionais ligados ao caso para estudar a legalidade ou não de tudo o que havia acontecido. Nessa reunião estava presente o Sr. Antonio Figueiras, diretor do IMIP que, constatando o abuso das atitudes da assistente social frente a nós, e especialmente com o pai, ligou ao hospital e mandou que fosse suspensa toda e qualquer iniciativa que favorecesse o aborto das crianças.E assim se fez [...]

Já a caminho da residência do Arcebispo, por volta das cinco e meia da tarde, Dom José Cardoso recebeu um telefonema do Diretor do IMIP no qual ele lhe comunicava que um grupo de uma entidade chamada Curumins, de mentalidade feminista pró-aborto, acompanhada de dois técnicos da Secretaria de Saúde de Pernambuco, teriam ido ao IMIP e convencido a mãe a assinar um pedido de transferência da criança para outro hospital, o que a mãe teria aceito. [...]

O que teriam dito as militantes do Curumim à mãe, para que ela mudasse de opinião? Seria semelhante ao que foi feito com o pai? [...] Convocamos órgãos de imprensa para fazer uma denúncia, frente ao apelo do pai que queria saber onde estava a sua filha.

Na manhã da quarta-feira, dia 4 de março, ficamos sabendo que a criança estava internada na CISAM. [...] Lá, por volta das 9 horas da manhã, nosso sonho de ver duas crianças vivas se foi, a partir de ato de manipulação da consciência, extrema negligência e desrespeito à vida humana.

Isto foi relatado para que se tenha clareza quanto aos fatos como verdadeiramente eles aconteceram.

 

Pe. Edson Rodrigues

Pároco de Alagoinha (PE)

padreedson@hotmail.com

Fonte: (http://www.salvemaria.org.br/index.php?system=news&news_id=610&action=read)

 

Veja:
http://www.catolicismo.com.br/materia/materia.cfm/

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