União Europeia: Manto imperial, ou camisa de força?


29/06/2011

Gabriel J. Wilson



A Irlanda votou contra o Tratado de Nice em 2001, e contra o Tratado de Lisboa em 2008

Os referendos: a “asa negra” de Bruxelas

No artigo Les référendums, bêtes noires de Bruxelles, colocado on line em 2-5-11 por “Mémoire des luttes”, o cronista Bernard Cassen comenta que os membros da Comissão Européia e os altos funcionários da UE detestam os referendos.

Primeiro, porque eles são organizados em âmbito nacional, em dissonância com a lógica supranacional da construção européia.

Segundo, porque eles constituem a expressão direta da soberania popular, sem os filtros das instituições da democracia representativa, com as quais muitos arranjos são possíveis. Os plebiscitos lembram que os povos ainda existem no Velho Continente.

Cassen acha que por enquanto a noção de “povo europeu” continuará a ser uma ficção. Por isso a UE tem um sério problema com certos povos que a compõem. Não que estes sejam hostis à União em princípio, mas porque rejeitam a canga das políticas manipuladas por instituições que agem em nome deles. Por isso, quando podem manifestar o que pensam, não perdem a ocasião.

Foi assim que em 1972 a Noruega recusou-se a aderir à já extinta Comunidade Econômica Europeia (CEE); que a Dinamarca rejeitou em 1992 o tratado de Maastricht; que em 2005 a França e os Países Baixos disseram “não” ao Tratado Constitucional Europeu; que a Irlanda votou contra o Tratado de Nice em 2001, e contra o Tratado de Lisboa em 2008.

Entretanto, salvo no caso da Noruega, um passa-moleque sempre acabou por transformar o “não” em “sim”.

Crise econômica na coleção de fracassos

Aos fracassos dos referendos, que recusaram os primeiros projetos de Constituição da UE e a adoção da moeda única, soma-se o fracasso econômico que obrigou a União a socorrer alguns de seus membros. Em 2010, os chefes de governo dos 16 países da zona do euro — em parceria com o Fundo Monetário Internacional (FMI) — aprovaram uma ajuda inicial à Grécia da ordem de 110 milhões de euros, para tentar impedir o alastramento da crise financeira que atinge esse país.

Os fatos demonstraram que tal socorro foi insuficiente, pois mesmo após o aumento da ajuda, o governo socialista da Grécia continua a debater-se com um déficit de 156 bilhões de euros. E cerca da metade de sua população opõe-se aos planos de socorro da UE.

Portugal e Irlanda tiveram de ser igualmente socorridos. A espada de Dâmocles do risco de falências em dominó continua suspensa, podendo cair em seguida sobre a Espanha e a Itália.

Imposições injustas de normas e organismos europeus

O jornalista Riccardo Cascioli, que escreve no “Avvenire” de Roma e em outras publicações italianas como “Il Timone” e “La Bussola Quotidiana”, relata em 6-4-11 vários casos que vêm acontecendo na Europa como resultado da imposição abusiva por organismos europeus de absurdas regras em matéria de educação e família, em geral por imposição do lobby homossexual. Eis um resumo:
• Na França, um professor pode perder o seu emprego se apresentar a alunos maiores de 16 anos um documentário em que explique exatamente o que é o aborto;
• Na Alemanha, os pais podem ir para a cadeia caso se recusem a que seus filhos da escola primária freqüentem cursos de educação sexual que mostrem imagens explícitas de savoir-faire sexuais;
• Na Inglaterra, enquanto um casal cristão que considera a homossexualidade um pecado é impedido de exercer a guarda de crianças, os homossexuais, pelo contrário, podem adotá-las;
• Em certos países, o ensino científico que admita a criação do universo por um Ser inteligente (Deus, para os que crêem) pode acarretar a perda da cátedra.

Cascioli comenta: é o triunfo, num conjunto de países, da “democracia totalitária”. Conservam as aparências exteriores de uma democracia, mas impõem a violência totalitária do “Estado da ética” (laica). Uma democracia sem valores morais transforma-se facilmente em totalitarismo — declarado ou fingido.


Movimento na Espanha a favor da liberdade de consciência

A objeção de consciência contra o aborto é negada na Espanha

Em 5 de abril de 2011, o 3º Tribunal Administrativo de Málaga rejeitou o recurso apresentado por médico de família de um Centro de saúde pública de Antequera que alegando razão de consciência havia pedido dispensa da obrigação de informar suas pacientes sobre os lugares onde elas poderiam submeter-se ao aborto.

O magistrado julgou que o fato apontado não viola a consciência de um funcionário público — no caso, a do médico em questão. Ou seja, a consciência embotada de um magistrado torna-se assim responsável pela extensão de uma medida injusta que afetará milhares de médicos espanhóis que declararam objeção de consciência contra a prática do aborto.


Roberto de Mattei: “Negamos que a entrada da Turquia na UE represente um benefício para a Europa. Pensamos, ao contrário, que introduzir 90 milhões de turcos na estrutura política e social europeia constituiria uma catástrofe irremediável para o continente”.

Rejeição das raízes cristãs da Europa e abertura para o islã

Apesar do empenho reiterado da Igreja Católica em defesa das raízes cristãs da Europa, a UE prepara a admissão da Turquia islâmica no bloco europeu.

Península asiática separada da Europa pelo Mar de Mármara, a Turquia possui pequeno território do lado europeu — a Trácia oriental, remanescença das conquistas do Império Otomano. Há meio século a Turquia se aproximou da Europa, tornando-se importante aliado ocidental no âmbito da Organização do Tratado Atlântico Norte (OTAN). A esse título conta não só com o apoio, mas até mesmo com certa pressão dos Estados Unidos para que seja admitida na UE.

Candidata de longos anos, a admissão da Turquia está por enquanto em banho maria devido às perplexidades e temores que suscita. Pois com uma população quase igual à da Alemanha e um islamismo que vem se radicalizando perigosamente, ela teria nas decisões da UE um peso proporcional ao número de seus habitantes.

Se admitida, a Turquia poderia ainda representar um rombo na malha de segurança da fronteiras européias, por onde poderiam passar eventualmente hordas de imigrantes oriundos do Oriente Médio, da Ásia e da África. Pois bastaria cruzar a porosa fronteira greco-turca para estar ao abrigo das proteções legais dos direitos humanos, respeitados pelos europeus, mas não pelos muçulmanos.

O Prof. Roberto de Mattei, vice-presidente do Centro Nazionale de Ricerca da Itália e autor de um livro sobre o problema da Turquia na Europa(4), falando recentemente no Bureau de representação da Federação Pro Europa Christiana em Bruxelas [vide box abaixo], defendeu a necessidade de se convocar um referendo sobre a entrada da Turquia na UE. O conferencista foi aplaudido quando respondeu a uma pergunta sobre o porquê da exclusão da opinião pública desse debate:

“Negamos — ressaltou o catedrático italiano — que a entrada da Turquia na UE represente um benefício para a Europa. Pensamos, ao contrário, que introduzir 90 milhões de turcos na estrutura política e social européia constituiria uma catástrofe irremediável para o continente”.

Os recentes acontecimentos no Norte da África e no Oriente Médio, com a fuga maciça de centenas de milhares de pessoas dos países em conflito, mostra a realidade do perigo de uma verdadeira invasão da Europa por populações majoritariamente muçulmanas.

Ódio à Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo

As matanças cruéis e implacáveis de cristãos no Iraque, no Egito, no Paquistão e na própria Turquia comprovam, por sua vez, a que ponto podem chegar os invasores, tanto mais quanto haverá, infiltrados entre eles, fanáticos homens-bomba dispostos ao covarde recurso de sacrificar pessoas inocentes em atentados.

A recusa da UE em reconhecer as raízes cristãs do Velho Mundo e em agir em conseqüência aumenta a sua fraqueza diante de um inimigo cujo radicalismo está disposto a todas as loucuras e ousadias. Para estes, a força parece ser a única razão.

Mas o ódio à Cruz não existe apenas entre os infiéis muçulmanos. Ele está presente também no mundo ocidental, entre os próprios europeus, ateizados pelo laicismo dominante largamente disseminado por toda espécie de seitas gnósticas ou agnósticas desde a Revolução Francesa.

Assim, já tivemos na Itália a queixa apresentada por um casal à Corte Européia dos Direitos Humanos de Estrasburgo contra a presença de Crucifixos nas escolas, sob a alegação de que isso pode ferir os sentimentos das crianças…! A Itália perdeu em primeira instância, mas recorreu e o tribunal deu provimento ao recurso. O caso mostra a que extremos pode chegar a perseguição religiosa na Europa!

Quem pratica realmente a verdadeira Religião em nossos dias está sujeito ao martírio nos países pagãos e de infiéis, e ao que já se chamou de “perseguição branca” nos próprios países ocidentais, pela imposição de leis iníquas, contrárias à Religião.

Que Maria Santíssima, Virgem Fidelíssima, Rainha dos Mártires, dos Confessores e das Virgens, proteja a todos os que a Ela recorrem neste tempo de provas e perseguições. Quem d’Ela se vale, não será decepcionado.

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Notas:
1. Cf. Plinio CORRÊA DE OLIVEIRA, A comunidade dos Estados segundo as normas de Pio XII, in Catolicismo nº 43, de julho de 1954.
2. A esse respeito é interessante assistir o vídeo da conferência do Prof. Elmar Altvater no Brasil, em 21-6-2005, no qual ele reconhece, não sem certo embaraço, o divórcio entre as populações da Europa e a tecnocracia governante.
3. Cf. “Flash Actualités” nº 63, de março de 2006.
4. La Turchia in Europa — Beneficio o catastrofe? Sugarco, Milano, 2009.

Pró Europa autêntica e cristã

Fundada no ano de 2002, a Federação Pro Europa Christiana (FPEC) reúne oito associações que atuam em diversos países do continente europeu. Seu principal objetivo é a defesa dos valores que modelaram durante séculos a civilização cristã e contribuíram de maneira decisiva para a grandeza da Europa. Sob a ação do processo multissecular que Plinio Corrêa de Oliveira chamou de Revolução, tais valores foram sendo abandonados, até chegarmos ao neopaganismo hodierno e a uma apostasia quase generalizada. As instituições européias desempenham um papel relevante nesse abandono através da promoção de leis atentórias ao Direito natural e ao Direito divino. Tais leis vão penetrando nos países membros e dando lugar a uma verdadeira ditadura legislativa. Daí a importância do trabalho desenvolvido pela FPEC.

Em dezembro de 2009, a Federação inaugurou seu Bureau de representação em Bruxelas — cidade erigida em capital da União Européia. Ali ela promove palestras e reuniões nas quais grupos e líderes conservadores estudam e discutem estratégias visando opor obstáculos às leis mais revolucionárias emanadas de órgãos da UE, estimulando assim o debate no próprio teatro de operações do jogo de poder europeu. As conferências visam ainda alertar o público para a verdadeira desconstrução da Europa profunda, uma conseqüência desses absurdos legais.

O diretor do Bureau, Duque Paul de Oldenburg, mantém freqüentes contatos com políticos e intelectuais de destaque, bem como com membros da nobreza.

Ele foi responsável pelo lançamento da campanha SOS Vita, a qual instou os deputados do Luxemburgo através de e-mails, a não votarem uma lei proposta pelo primeiro ministro Junker para liberalizar ainda mais o aborto naquele país. O projeto, que seria discutido em julho de 2010, continua em “compasso de espera”. Em fins de 2010 o Bureau organizou uma interpelação ao primeiro ministro, pedindo-lhe para explicar a contradição existente entre o nome cristão adotado pelo seu partido (ele é líder do CSV — partido Democrata-Cristão luxemburguês) e o programa que defende. Além de ter sido o motor da introdução da eutanásia no país em 2008, o CSV pretende agora reconhecer legalmente a união entre homossexuais, concedendo-lhes inclusive o direito de adotar crianças.

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