Comissão avalia que momento não é adequado para o governo
encaminhar projeto para votação
DA REPORTAGEM LOCAL
Dentro e fora da comissão tripartite que discute a revisão da
legislação punitiva do aborto, é unânime a opinião
de que este não é o melhor momento político para o governo
federal encaminhar à Câmara ou ao Senado um projeto de lei que
trate da descriminalização do aborto.
Um anteprojeto, elaborado por cinco dos 18 integrantes da comissão,
será apresentado na segunda-feira aos demais membros.
"
A situação é muito complicada. É incendiar a fogueira",
diz Gilberta Santos Soares, coordenadora das Jornadas Brasileiras pelo Aborto
Legal e Seguro, referindo-se às denúncias de corrupção
que vêm atingindo o PT. Porém, ela avalia que o papel do governo
seja o de assumir seu compromisso de enviar e acompanhar o anteprojeto no sentido
de fazer valer os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, como prevêem
tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário.Ela diz
que será fundamental uma mobilização da sociedade para
que a proposta chegue e tramite no Legislativo.
O anteprojeto amplia ainda o prazo da interrupção da gravidez
para 20 semanas em casos de estupro e não limita tempo para o aborto
em casos de risco à mãe e de má-formação
do feto.
Para o ginecologista Aníbal Faúndes, será preciso uma
campanha educativa dirigida à população explicando o projeto
e a importância da sua aprovação.
Cientes da fragilidade do governo, as feministas estavam confiantes de que
o senador Eduardo Suplicy (PT) se ocupasse do encaminhamento do projeto ao
Senado. Ontem, porém, Suplicy descartou essa hipótese, pelo menos
neste momento. Embora oficialmente fizesse parte da comissão, ele disse
que, em razão das turbulências no Legislativo (leia-se CPIs dos
Correios e do ""Mensalão"), não conseguiu participar
das reuniões e que, por ter mandado representante, desconhecia o teor
do projeto. "A questão é delicada. É preciso ter
prudência e cuidado. Respeito todas as opiniões, inclusive as
da Igreja Católica e de outros grupos religiosos."
O projeto também pode sofrer críticas ao ser apresentado ao restante
da comissão, que tem na sua composição duas parlamentares
escolhidas pelo presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), que é católico
praticante e contrário ao aborto.
De início, o governo quis incluir na comissão uma participação
religiosa, mas o Conic (Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil)
declinou do convite. A CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil)
protestou contra a comissão e sua composição.
(CLÁUDIA COLLUCCI)