Governo adia entrega de projeto sobre aborto
Folha de São Paulo
06/09/2005
CLÁUDIA COLLUCCI DA REPORTAGEM LOCAL
http://www1.folha.uol.com.br/
LEGALIZAÇÃO
EM DEBATE
Deputada não recebeu texto que prevê a descriminalização
da prática por suposta pressão da CNBB
Por supostas pressões da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos
do Brasil), o governo federal decidiu adiar a entrega do anteprojeto elaborado
pela comissão tripartite, que prevê a descriminalização
do aborto no país.
A entrega do documento à deputada Jandira Feghali (PC do B) estava agendada
para o dia 1º de setembro, mas, um dia antes, a ministra Nilcéia
Freire (Política para as Mulheres) desmarcou o encontro. Prometeu que
depois explicaria o ocorrido, mas até agora não se manifestou,
segundo a assessoria de Feghali.
O anteprojeto elaborado
pela comissão seria incorporado a outro que
tramita na Câmara, cuja relatora é Feghali. Dessa forma, não
precisaria entrar no fim da fila de projetos que aguardam apreciação
do mérito na Comissão de Seguridade Social e Família.
O recuo do governo já era esperado pelos parlamentares. Especialmente
após o presidente Luiz Inácio Lula da Silva enviar uma carta
a dom Geraldo Majella, durante a Assembléia Geral da CNBB, no mês
passado, em que reafirmou sua "posição em defesa da vida
em todos os seus aspectos e em todo o seu alcance".
"
Naquele momento ficou muito claro que o anteprojeto não andaria. É um
retrocesso. Não faz o menor sentido as mulheres continuarem a ser criminalizadas
[por praticar aborto]", diz a deputada federal Iara Bernardi
(PT).
Na avaliação de Fátima de Oliveira, secretária-executiva
da Rede Feminista de Saúde, a carta de Lula à CNBB foi lamentável. "Pessoalmente,
ele pode expressar suas questões de fé, mas não como sendo
posição do Estado brasileiro, que é laico",
afirmou.
Ao movimento de mulheres,
Nilcéia Freire informou que o anteprojeto
será entregue no próximo dia 20. "Confiamos na palavra da
ministra", afirma Oliveira.
Procurada pela Folha,
Nilcéia Freire não foi localizada. Segundo
a sua assessoria de imprensa, ela estava se preparando para viajar hoje a trabalho
a Mar Del Plata (Argentina).
Anteprojeto
O anteprojeto elaborado
pela comissão tripartite reúne muitas
semelhanças ao substitutivo de Feghali, ao qual ele deveria ser integrado.
Ambos propõem a descriminalização do aborto até a
12ª semana de gestação e em qualquer idade gestacional quando
a gravidez implicar risco de vida à mulher ou em caso de má formação
fetal incompatível com a vida. Também asseguram que o SUS realize
a interrupção da gravidez e revogam os artigos do Código
Penal que tratam o aborto como crime.
A novidade no projeto
da comissão é a obrigação
de os planos de saúde cobrirem os custos com o aborto e a necessidade
de autorização do Ministério Público, além
dos responsáveis legais, para que a interrupção seja
realizada em menores de 18.
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