Parecer técnico do Ministério da Justiça justifica aborto de anencéfalo
21/02/2006
Boletim "Nascer é um direito”
Foi aprovado dia 13 de fevereiro de 2006 , por unanimidade, no
Conselho Nacional
de Política Criminal e Penitenciária órgão de assessoramento
do Ministro da Justiça, parecer favorável do Projeto de Lei 4403/04,
de autoria da Deputada Jandira Feghali, do PcdoB-RJ, que defende a legalização
do aborto no caso de anencéfalos. Ao CNPCP cabe emitir parecer sobre projetos
de lei relacionados à área penal, encaminhados ao gabinete do Ministro
da Justiça. O parecer técnico, que mais parece um manifesto pró-aborto,
usa a conhecida manipulação terminológica relativista dos
abortistas para justificar o injustificável, ou seja, o assassinato de
um inocente indefeso.
Os fatos
Foi apresentado em novembro
de 2004 um projeto de lei (4403/04) de autoria da deputada comunista Jandira
Feghali que acrescenta mais um inciso
ao artigo
128 do Código Penal, que assim não puniria mais o aborto praticado
por médico, não somente nos casos de estupro e quando está em
jogo a vida da mãe mas também “quando há evidência
física embasada em técnica complementar, em que o nascituro apresenta
grave e incurável anomalia que implique na impossibilidade de vida extra-uterina”.
Trata-se de projeto, portanto, que despenaliza o aborto em todos os casos de
doenças graves e incuráveis do feto, sem condições
de vida extra-uterina.
Foi esse projeto 4403/004
apensado ao projeto 1135/91, que prevê a total
descriminalização do aborto. Logo a seguir, em 7 de janeiro de
2005, a deputada Feghali pediu se desapensamento, o que foi concedido.
Foi aprovado pela Comissão de Seguridade Social e Família em
20 de maio de 2005, com parecer favorável do Deputado Rafael Guerra,
que o reduziu ao caso de anencefalia e exigiu o consentimento da mãe.
O relatório chega ao cúmulo de dizer que o anencéfalo “é um
ser desprovido de córtex cerebral” , e que “ ...isso o coloca
numa condição subumana, pois a espécie humana distingue-se
das demais espécies animais pela atividade cerebral complexa, decorrente
de estruturas encefálicas mais evoluídas que as dos demais seres”.
Argumento que não encontra guarida na ciência médica e
que se iguala às teses eugênicas do nazismo e do darwinismo .
O projeto está hoje na Comissão de Constituição
e Justiça e da Cidadania, sendo seu relator o Deputado Odair Cunha do
PT-MG.
Tratando-se de anencéfalos, o tema do aborto vinha sendo discutido
no Judiciário na Argüição de Descumprimento de Preceito
Fundamental ajuizada perante o STF pela Confederação Nacional
dos Trabalhadores na Saúde, ainda “sub judice”. A Ministra
Ellen Grace, em seu voto observou: “Entendo...que a sociedade brasileira
precisa encarar com seriedade e consciência um problema de saúde
pública que atinge principalmente as mulheres das classes menos favorecidas.
E deve faze-lo por meio de seus legítimos representantes perante o Congresso
Nacional, não ao contrário, por via obliqua e em foro impróprio,
mediante mecanismos artificiosos...”. “Não há de
o Supremo Tribunal Federal de servir de ‘atalho fácil’ para
a obtenção de resultado – a legalização da
prática de abortamento – que os representantes do povo brasileiro
ainda não se dispuseram a enfrentar”.
Os abortistas tentaram
então mais um “atalho fácil”.
Desta vez junto ao Executivo, no Ministério da Justiça, uma nova
forma de pressão, que é o parecer técnico ora aprovado
CNPCP. Estão agora Legislativo, Judiciário e Executivo envolvidos
na discussão.
Um parecer que
mais parece
um manifesto pró-aborto
O parecer técnico da advogada Ana Sofia Schmidt de Oliveira, aprovado
por unanimidade na CNPCP do Ministério da Justiça, mais parece
um manifesto pró-aborto. Depois de enumerar alguns argumentos contrários à proposta
em análise manifesta-se nesses termos: “ Assim reagem e resistem à possibilidade
do abortamento em caso de anencefalia fetal com a mesma paixão com que
reagem e resistem à possibilidade de abortamento do feto saudável.
Uma rápida pesquisa nas páginas da Internet que contém
discussões dedicadas ao tema mostra freqüentes assertivas do gênero:`primeiro
querem autorizar o aborto do feto anencéfalo; depois vão querer
legalizar o aborto em caso de qualquer anomalia´. Como se a anencefalia
fosse qualquer anomalia’. Só que ela se esqueceu que o projeto
inicial referia-se a qualquer anomalia!
Depois de ironizar que
algumas teses pró-vida “enxergam na proposta
uma estratégia de grupos pró-aborto para fazer inserir no ordenamento
jurídico brasileiro a legalização paulatina de qualquer
forma de aborto”, usa o argumento de que “nosso ordenamento penal
já autoriza o aborto em duas circunstâncias”. Diz ainda
que é “difícil compreender porque tanta discussão
em torno do tema da anencefalia. Os mesmos bens jurídicos tutelados
pelas hipóteses vigentes de aborto legal – a vida da gestante,
sua saúde física, sua saúde mental, sua saúde psíquica – são
invocados no caso da proposta legislativa em tela e, o que é mais relevante,
sem o sacrifício da vida do feto. Porque aqui não há possibilidade
de vida extra-uterina”. (Os grifos são nossos).
Um parecer técnico,
que deveria, por principio, ser imparcial, fica tisnado em seus argumentos
por uma parcialidade desconcertante.
Os argumentos básicos do parecer técnico fazem parte da manipulação
terminológica dos movimentos pró-aborto.
A redatora do parecer técnico considera que a questão não
possui grande complexidade. O caráter imoral, discriminatório
e cruel da prática abortiva é apresentado sob o véu atenuante
de certas expressões e por sofismas habilmente manipulados. Usa os chavões
abortistas em sua argumentação.
É freqüente entre os abortistas, por exemplo, encobrirem o assassinato
do nascituro pela expressão “interrupção da gravidez”.
Falam também com freqüência em “aborto terapêutico”.
Aborto sempre significa morte. Terapia, cura. Então “aborto terapêutico” significa
cura pela morte. Assim por diante, por meio da manipulação das
palavras vão aproveitando todas as oportunidades para tentar iludir
a opinião pública e desviar a atenção da única
verdade: todo aborto provocado é uma eliminação cruel
e violenta do nascituro.
Os dois casos de aborto autorizados pela lei penal brasileira.
Diz o parecer: “O nosso ordenamento penal já autoriza o aborto
em duas circunstâncias. O aborto é legal se a gravidez resulta
de estupro e se coloca em risco a vida da gestante. Nestes dois casos previstos
pelo artigo 128 do CP há plena viabilidade do feto. Há vida,
há objeto jurídico a ser tutelado. Mas, diante de outros valores,
o imperativo da proteção à vida é relativizado.
E quais são os outros valores? No caso do aborto sentimental, também
denominado ético ou humanitário, o direito penal solidariza-se
com a mulher vítima de estupro e não exige dela que carregue
em seu ventre o resultado de tão grande violência física
e psíquica como é o estupro. No caso do aborto necessário
ou terapêutico, o direito penal também se coloca ao lado da mulher
e não exige dela que sacrifique sua vida em favor da vida que traz em
potencial dentro de si.”
Não é porque permitido em lei que o aborto em casos de estupro
deixa de ser a eliminação cruel do inocente, e portanto, imoral.
Nem o estuprador é condenado à morte. Quanto ao trauma não
culposo que se procura evitar, se a associação de imagem do filho
com o fato do estupro for intransponível, ainda existiria o remédio
de entregar o bebê a pessoas ou instituições que poderiam
adotá-lo. Nunca matar uma vítima que não teve culpa de
ser gerado. O que a tese abortista esconde, é que ao optar pelo aborto,
a mãe não escapará à síndrome pós-aborto,
com seus problemas emocionais, psicológicos e psiquiátricos,
além das conseqüências físicas imediatas ou retardadas,
muito piores, reconhecidas pela Medicina. É o contrário do que
ocorreria se ela decidisse criar o filho, elevada e dignificada aos próprios
olhos e da sociedade, pela prática de um ato nobre e meritório.
O argumento do parecer perde assim seu embasamento.
Na hipótese de estar em jogo a vida da mãe, assim como não
podemos matar a mãe para salvar a vida da criança, também,
moralmente, não podemos matar a criança para salvar a vida da
mãe. Ao médiico caberá fazer todo o possível para
salvar a vida das duas. Nada mais. Aliás, com os avanços da ciência
médica esses casos praticamente inexistem.
O que diz a Medicina
não é o
que dizem os abortistas
Diz o parecer : “A medicina afirma sem margem de erro: não há possibilidade
de vida fora do útero e por isso o feto que padece de anencefalia é considerado
natimorto. Mais de 65% dos casos resultam em morte ainda dentro do útero.
Ao lado desta constatação, lembre-se que o nosso sistema jurídico
abriga a lei dos transplantes (lei federal 9.434/97) que considera cessada
a vida quando se dá a morte encefálica – de acordo com
referida legislação, a retirada de tecidos ou partes do corpo
humano para transplante deve ser precedida pela morte encefálica. A
resolução do Conselho Federal de Medicina nº 1.752, de 8
de setembro de 2004, autoriza o transplante de órgãos do anencéfalo
após o seu nascimento. A mesma resolução considera os
anencéfalos “natimortos cerebrais” e diz que possuem “inviabilidade
vital por ausência de cérebro”.
Esse assunto foi tratado
com maestria pelo Dr. Paulo Silveira Martins Leão
Junior, Procurador do Estado e Presidente da União dos Juristas Católicos
do Rio de Janeiro em “ O Direito Fundamental à Vida dos Embriões
e Anencéfalos”, capítulo do livro “Direito Fundamental à Vida”,
do qual é co-autor, (Ed. Quartier Latin, 2005), baseado em farta documentação
científica, do qual citamos alguns trechos:
“O termo anencefalia designa uma falha no processo de formação
do embrião entre o 16º e 26º dia de gestação,
em razão da qual se verifica ausência variável da calota
craniana, dos tecidos que a ela se sobrepõem, dos hemisférios
cerebrais e cerebelo.”
“A anencefalia não significa morte cerebral (grifo nosso). O
bebê anencefálico não possui, em graus variáveis,
as partes superiores do cérebro, mas possui as demais. Por isso manifesta
várias atividades vitais como respiração, batimentos cardíacos,
capacidade de movimentação, de responder a estímulos,
de se alimentar e se desenvolver. Ao nascer, a lesão cerebral em geral,
aparece estabilizada e a morte ocorre principalmente por insuficiência
respiratória. Deve-se admitir, em razão das partes existentes
e ao menos em casos menos graves, a possibilidade de alguma forma de consciência
e capacidade de sentir dor. Depoimentos de mães que tiveram filhos anencefálicos
e que viveram por dias ou mesmo meses apontam nesse sentido.”
“A gravidez de um feto anencefálico não coloca em risco
a vida da mãe”
Quanto à morte cerebral do anencéfalo, o documento “O
Recém Nascido Anencefálico e a Doação de Órgãos”,
aprovado por unanimidade pelo Comitê Nacional de Bioética da Itália
diz:” No caso do recém-nascido anencefálico a demonstração
da morte cerebral apresenta grandes dificuldades ligadas ao conhecimento ainda
imperfeito da neurofisiologia neonatal em sentido geral e também à própria
condição de malformação do sujeito”.
A American Medical Association – AMA, considera o anencéfalo
um ser humano vivo até que venha a ser constatada sua morte com critérios
aplicáveis aos seres humanos em geral. E reconsiderou um posicionamento
em que considerava o anencéfalo neonato como um caso a parte para fins
de doação de órgãos, colocando-os nos mesmos padrões
e regras utilizados para as doações de órgãos em
geral.
Dignidade x dignidade
O parecer técnico continua: “Vale ainda transcrever trecho do
pronunciamento do Ministro Joaquim Barbosa, relator do HC 84.025-6/RJ, citado
na inicial da ADPF acima referida. “Em se tratando de feto com vida extra-uterina
inviável, a questão que se coloca é: não há possibilidade
alguma de que esse feto venha a sobreviver fora do útero materno, pois,
qualquer que seja o momento do parto ou a qualquer momento que se interrompa
a gestação, o resultado será invariavelmente o mesmo:
a morte do feto ou do bebê. A antecipação desse evento
morte em nome da saúde física e psíquica da mulher contrapõe-se
ao princípio da dignidade da pessoa humana, em sua perspectiva da liberdade,
intimidade e autonomia privada? Nesse caso, a eventual opção
da gestante pela interrupção da gravidez poderia ser considerada
crime? Entendo que não, Sr. Presidente. Isso porque, ao proceder à ponderação
entre os valores jurídicos tutelados pelo direito, a vida extra-uterina
inviável e a liberdade e autonomia privada da mulher, entendo que, no
caso em tela, deve prevalecer a dignidade da mulher, deve prevalecer o direito
de liberdade desta de escolher aquilo que melhor representa seus interesses
pessoais, suas convicções morais e religiosas, seu sentimento
pessoal.”
Se colocarmos a dignidade
da mulher contra a dignidade de seu filho, trata-se de uma discriminação que atenta contra o direito do anencéfalo
de nascer, viver o tempo que lhe é dado por Deus, ser batizado, receber
o nome próprio, morrer em paz e ter sepultura digna e não ser
lançado como um dejeto na lata de lixo hospitalar, depois de ter sido
esquartejado e assassinado cruelmente. Onde fica a dignidade da própria
mãe que permite isso e em nome da qual se pretende aprovar esse infanticídio
em massa? Sem dó, nem piedade!
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