O acolhimento a S.S. Bento XVI no Brasil
08/06/2007
Santiago Fernández
O Brasil católico manifestou seu agrado com a defesa que o Sumo Pontífice
fez da família tradicional, da fidelidade conjugal e da castidade, e com
as censuras à prática do aborto e da eutanásia
Fiéis lotam
largo de São Bento para ver o S. S. Bento XVI |
Antes
da viagem de Bento XVI, eminentes purpurados deram a entender que ela seria
marcada por abordagens apenas genéricas pelo Sumo Pontífice,
dos graves problemas que afligem o Brasil.
Assim, o então presidente da CNBB e primaz do Brasil, Cardeal Geraldo
Majella Agnelo, declarou à imprensa que S.S. Bento XVI não entraria
em temas candentes como o aborto, a eutanásia e “outros problemas
setorizados”,(1) limitando-se a expressões genéricas sobre
a vida, que obviamente a Igreja não poderia omitir sem deixar de ser
Ela mesma. O Cardeal Cláudio Hummes, prefeito da Congregação
para o Clero e membro da comitiva pontifícia, ainda em Roma anunciou
que o Pontífice não traria uma “agenda moralista” a
São Paulo.(2)
O Cardeal Bertone, Secretário de Estado, sugeriu uma agenda diversa
da que acabou se realizando: “Se um governo de esquerda se preocupa em
favorecer os mais pobres, promover repartição mais igualitária
da terra, [...] se faz tudo isso, pode receber o aplauso e colaboração
da Igreja”.(3) O presidente Lula previa que a visita intensificaria a
colaboração da “ação social da Igreja Católica” com
os “movimentos sociais”, os “oprimidos” e os “excluídos”.(4)
Ao mesmo tempo reafirmava sua posição favorável ao aborto,
enquanto presidente do País.(5)
“Valores radicalmente cristãos” a
serem conservados
Porém, já no avião que o conduzia à Terra de Santa
Cruz, o Pontífice confirmou o Código de Direito Canônico
que pune com a excomunhão aqueles que participam de um aborto provocado.
Os católicos brasileiros, cuja maioria é anti-abortista, foram
consolidados em sua posição quando o ilustre visitante, ao descer
no Aeroporto Internacional de Cumbica, reafirmou ante o presidente brasileiro
as posições da Igreja contra o aborto e a eutanásia, e
em defesa da família tradicional.(6)
O mito revolucionário dissemina a idéia de que a adoção
de posições como essas só produz desinteresse ou antipatia.
Foi bem o contrário o que se deu. A própria mídia, caixa
de ressonância habitual dos contra-valores revolucionários, percebendo
que o público aguardava com ansiedade essas verdades, apresentou-as
em grandes manchetes. E a opinião pública brasileira ouviu com
satisfação afirmações rotuladas arbitrariamente
como “retrógradas” e “moralistas”. E também
quando tomou conhecimento da declaração de que o Brasil e a América
Latina “conservam valores radicalmente cristãos que jamais serão
cancelados”.(7)
Inúmeros católicos aplaudiram o elogio da castidade, da fidelidade
conjugal e da virgindade; sintonizaram com a expressão “ferida
do divórcio”; e associaram-se à condenação
do aborto e da eutanásia.
Regozijo do público: alerta contra males da
atualidade
No estádio
do Pacaembu, juventude rejeita o aborto |
O público brasileiro, especialmente o católico, regozijou-se
com a condenação de certa mídia que ataca sistematicamente
a instituição familiar e com a referência à ideologia
milenarista que falsamente prometia a “redenção” dos
pobres (leia-se, a Teologia da Libertação).
O mito básico da subversão comuno-missionária também
foi abordado. Com satisfação, numerosos católicos viram
comprovada sua convicção de que a “utopia de voltar a dar
vida às religiões pré-colombianas [...] não seria
progresso, mas retrocesso”; que a evangelização do continente “não
comportou, em nenhum modo, uma alienação das culturas pré-colombianas,
nem foi a imposição de uma cultura estrangeira”; e que
a conversão dos índios enriqueceu a América Latina.(8)
Estádio
do Pacaembu |
Uma preocupação de inúmeros brasileiros quanto a governos
autoritários latino-americanos foi corroborada: “Tais governos
estão sujeitos a certas ideologias que pareciam superadas, e que não
correspondem à visão cristã do homem”. Viu-se na
frase uma alusão ao socialismo marxista e a governos como o do coronel
Hugo Chávez, na Venezuela, de Evo Morales, na Bolívia, e outros
congêneres.
Bento XVI, nesse mesmo discurso no último dia de sua estada no País,
observou que “o sistema marxista, onde chegou ao poder, não deixou
só uma triste herança de destruição econômica
e ecológica, mas também uma dolorosa destruição
dos espíritos”. E lamentou igualmente a situação
reinante no Ocidente, com um crescente desnível entre pobres e ricos
e “inquietante degradação da dignidade pessoal com a droga,
o álcool e as enganosas miragens de felicidade”. Há, contudo,
uma distinção a fazer entre a situação socioeconômica
do Ocidente atual e a do sistema marxista. O que vem corroendo o Ocidente é sobretudo
a Revolução Cultural, cujas manifestações –– como
a corrupção moral, o divórcio, o aborto, o “casamento” homossexual –– foram
condenadas em pronunciamentos e discursos anteriores durante a visita. Sobre
o sistema econômico vigente no Ocidente, convém lembrar ser bastante
esclarecedor o pronunciamento de Pio XII, na Radiomensagem ao Katholikentag
de Viena, de 14 de setembro de 1952, que transcrevemos em nota.(9)
Canonização de Frei Galvão, ponto
alto da visita
Multidão
de um milhão de pessoas na canonização de Frei
Galvão |
Talvez o auge da viagem tenha sido a
primeira canonização de
um santo nascido no Brasil: Santo Antonio de Sant'Anna Galvão.
Para gáudio do público de 1 milhão de pessoas, o novo
santo foi exaltado como modelo de vida atualíssimo para o presente.
Ressaltou-se que Frei Galvão foi escravo de amor de Nossa Senhora — ou
seja, o oposto do ideal libertário e igualitário hodierno — “fervoroso
adorador da Eucaristia, prudente e sábio orientador das almas que o
procuravam e grande devoto da Imaculada Conceição de Maria, de
quem ele se considerava ‘filho e perpétuo escravo’”.
E ainda: “Que belo exemplo a seguir deixou-nos Frei Galvão! Como
soam atuais para nós, que vivemos numa época tão cheia
de hedonismo, as palavras que aparecem na Cédula de consagração
da sua castidade: ‘Tirai-me a vida antes que ofender o vosso bendito
Filho, meu Senhor’. São palavras fortes, de uma alma apaixonada,
que deveriam fazer parte da vida normal de cada cristão”.(10)
Quem poderia imaginar que, em São Paulo e outros estados do País,
há uma juventude católica tão numerosa! Eram jovens ordeiros
e compostos os que compareceram ao estádio do Pacaembu. Nesta época
em que tudo aponta para a relativização, a ambigüidade e
a confusão, para o prosaísmo e a vulgaridade, tal juventude era
bem diversa das torcidas organizadas que freqüentam aquele estádio.
Nesse evento, 45.000 jovens católicos estiveram presentes, e os mais
de 10.000 homens do dispositivo de segurança não registraram
sequer uma ocorrência!
O Brasil católico experimentou um reconforto
De todo o exposto, uma primeira constatação assoma aos espíritos:
do Brasil flagelado por toda espécie de ofensivas do socialismo, do
comunismo e do progressismo católico; corroído pela violência
criminosa, de um lado, e pelos “movimentos sociais”, de outro;
assediado pela imoralidade avassaladora e pela Revolução Cultural,
que visa inverter a própria ordem externa e interna do homem, da família
e da sociedade –– esse Brasil sentiu-se reconfortado.
Expoentes do progressismo católico ensaiaram protestos, que se tornaram
insignificantes e passaram praticamente desapercebidos do público.
O Brasil católico tomou mais consciência de seu imenso potencial
não apenas quantitativo, mas também qualitativo. Qualidade que
se manifestou no desejo de integridade e radicalidade em matéria da
fé e da moral verdadeiras.
Sem dúvida o anti-Brasil –– o do caos provocado pela Revolução
Cultural, do progressismo católico, do socialismo –– tentará abafar
ou diminuir o impulso de alma que vários setores do Brasil autêntico
externaram nesses dias. Contra essa tentativa, imploramos confiantes a intervenção
de Nossa Senhora Aparecida, Rainha e Padroeira do País.
__________
Notas:
1. “O Estado de S. Paulo” (OESP), 6-5-07.
2. “Folha de S. Paulo” (FSP), 9-5-07.
3. OESP, 9-5-07.
4. OESP, 8-5-07.
5. FSP, 8-5-07.
6. OESP, 10-5-07.
7. OESP, 10-5-07.
8. OESP, 14-5-07.
9. "Se os sinais dos tempos não enganam, na segunda fase das controvérsias
sociais, em que já entramos, têm precedência outras questões
e problemas. Citamos aqui dois deles. A superação da luta de
classes por uma recíproca e orgânica ordenação entre
empregador e empregado. Pois a luta de classes nunca poderá ser um objetivo
da ética social católica. [...] Ademais, a proteção
do indivíduo e da família, frente à corrente que ameaça
arrastar a uma socialização total, em cujo fim se tornaria pavorosa
realidade a imagem terrificante do Leviathan" (Discorsi e Radiomessaggi,
vol. XIV, p. 314).
10. Zenit, 11-5-07.
Veja:
http://www.catolicismo.com.br/
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