A safra agropecuária, a crise e a “oligarquia dos pardais”


25/07/2009

Hélio Brambilla

Apesar da situação de inferioridade em que foi colocado o agronegócio, em razão da política econômica do governo federal, a produção agropecuária continua sendo um esteio vital para o País

Muitos leitores estarão se perguntando qual o “balanço” da safra, que todos os anos publicamos. O que vem acontecendo com a cadeia produtiva do agronegócio, que caminhava tão bem até o final de 2008? Que influência exerce sobre ela a crise financeira mundial?

Depressão nas cidades...

Os alquimistas da atual crise financeira, talvez acostumados com o elixir polivalente que diziam existir na Rússia comunista (o qual tinha o condão de curar desde unha encravada até câncer), querem mudar o mundo: Livrando-se da herança do presidente Bush, fonte de todos os males; Diminuindo o consumo, e com isso resolvendo o tão propalado “aquecimento do planeta”; Estabelecendo uma moeda global, que seria uma panacéia.

É verdade que muitos empresários, que apostavam no ganho fácil das especulações, literalmente “caíram do cavalo”. O mesmo se deu com governantes que faziam promessas messiânicas, e se vêem agora acuados pela recessão, pelo desemprego e pela queda na arrecadação de impostos, entre outros desafios.

No Brasil, concretamente, em que setores a “crise” se propagou? As grandes cidades brasileiras, que vivem da atividade bancária, industrial, comercial e da prestação de serviços, vêm padecendo de desemprego em razão da desaceleração acentuada do crescimento, apesar do matraquear da propaganda oficial do PAC.

...e pujança nos campos

Em nossos campos, onde atua o agronegócio, a situação é diferente, e até bem diferente. A revista “Globo Rural” chegou a fazer uma edição especial para o Agrishow de Cascavel (PR), hoje o maior da América Latina e o primeiro no cronograma de exposições em 2009. Seu editorial assim se expressou: “O show rural Coopavel servirá de termômetro para medir os ânimos dos produtores e as perspectivas para o campo no decorrer de 2009. [...] O setor agropecuário tem tudo para atravessar a tempestade sem sofrer perdas irreparáveis, e não há nenhum otimismo ingênuo aqui e nem poderia ser diferente, diante das óbvias nuvens escuras que a crise financeira plantou no horizonte de todas as nações do planeta”.

Ora, o Show Rural teve um recorde de 183 mil visitantes, superando pelo segundo ano consecutivo o pioneiro dos agrishows, o de Ribeirão Preto (SP). Os similares de Não-Me-Toque (RS), Rio Verde (GO) e o Tecnoshow de Maracaju (MS) também alcançaram os resultados almejados. Apenas o de Ribeirão Preto, em razão de uma disputa política referente à mudança do evento para a cidade de São Carlos, teve o seu desempenho um tanto prejudicado.

Quanto às grandes exposições agropecuárias de Londrina, Campo Grande, Uberaba, Maringá e Goiânia, entre outras, os resultados, apesar da situação difícil do último trimestre de 2008 e de terem sido um pouco menores em alguns aspectos, superaram as edições anteriores.

O conjunto das atividades do agronegócio encerrou 2008 com um recorde de exportações de 70 bilhões de dólares, ficando o saldo positivo em 60 bilhões de dólares.

Alguém poderia objetar: “Por que o saldo geral do Brasil foi o mais baixo dos últimos anos, apenas de 20 bilhões de dólares?” A razão foi o decréscimo de outros setores da economia, como o da badalada Petrobrás, que, apesar de ter sido usada para a reeleição do presidente Lula em 2006, com o slogan da auto-suficiência do petróleo, registrou em 2008 um vergonhoso déficit de 13,4 bilhões de dólares (ver fac-símile ao lado). Cabe ressaltar, de passagem, que tal rombo poderia ter sido ainda maior, não fosse a ponderável ajuda do setor sucro-alcooleiro, que produziu o equivalente a 400 mil barris/dia de álcool combustível e chegou mesmo a superar o consumo de gasolina.

Ação negativa do governo federal


“O Estado de S. Paulo”, Notas & Informações – p. A3, 7/1/2009 font>
O êxito do setor agropecuário só não foi maior devido aos desacertos do governo federal. Em relação ao trigo, por exemplo, pesou fato de não se garantir o preço mínimo combinado com os produtores e ainda se importar o produto no exato momento em que a safra estava sendo colhida, percalços que fizeram despencar os preços, prejudicando muito os produtores.

De outro lado, a política do governo no tocante ao setor sucro-alcooleiro foi muito enredada, tanto em face do grande aumento da produção de açúcar e de álcool como da quebra de contratos internacionais para a exportação desses produtos. Isso trouxe grave conseqüência: cerca de 30 milhões de toneladas de cana não foram colhidas na região centro-sul do País, o equivalente à metade de toda produção do Nordeste. Se o governo tivesse adotado o “imposto zero” para quem colhesse e processasse o excedente da safra, ou mesmo autorizado a venda direta do álcool das usinas para o consumidor a preços bem inferiores aos do mercado, o estoque excedente seria desovado para o bem do povo e teria gerado milhares de empregos!

Portanto, numa visão de conjunto, o agronegócio esteve à altura do seu papel histórico de produzir comida farta e barata para a mesa dos brasileiros, gerando milhões de empregos e muitas divisas, através de sua crescente exportação.

Perpectivas favoráveis da nova safra

Apesar da “crise” e de alguns problemas (seca no Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e Mato Grosso do Sul, além de enchentes do Norte e Nordeste), as perspectivas da safra para 2009 são muito promissoras. Segundo as previsões, a safra de grãos ficará apenas uns 10% abaixo da do ano passado.

Também no Mato Grosso do Sul, o estado maior exportador de carnes, houve problemas localizados. Por exemplo, o de frigoríficos que ficaram em situação difícil ao tentarem especular com dólares, comprometendo muito a vida dos pecuaristas.

O primeiro trimestre de 2009 funcionou como uma boa amostragem do panorama do ano. Apesar de termos exportado menos do que em igual período do ano passado, as receitas em nossa moeda foram maiores em virtude do dólar valorizado.

Está previsto um aumento acentuado na produção da cana-de-açúcar, em razão da melhora dos preços do açúcar no mercado internacional com a quebra da safra indiana. O preço do álcool está abaixo do tolerável para os produtores, mas alto demais nas bombas. Como “perguntar não ofende”, de quem deve ser a culpa dessa disparidade? Muitos, não sem razão, apontam ser a Petrobrás. E ainda assim, a produção deverá passar de 30 bilhões de litros de álcool combustível, ou seja, mais de 500 mil barris-equivalentes por dia.

No quesito carnes e grãos, a produção, o consumo e as exportações vão paulatinamente chegando aos patamares do ano passado antes da eclosão da “crise”.

Sabedoria do filósofo e resistência do agronegócio

Na cidade de Campo Grande (MS), quando participava da exposição agropecuária, encontrei uma edição de 1965 da obra A Política, de Aristóteles*. É significativo o que aquele filósofo dizia há quase 2.500 anos, num texto que, a meu ver, se encaixa como uma luva para explicar a “crise” e o papel do agronegócio brasileiro em face dela:

“Muitas vezes, considera-se como riqueza a abundância de metais cunhados, porque tal abundância representa o objeto da ciência da indústria e do pequeno comércio. Por outro lado, vê-se a moeda como uma vã brincadeira sem qualquer fundamento natural, pois que aqueles mesmos que dela fazem uso podem realizar outras convenções, e a moeda deixará de ter valor ou utilidade, e a um homem rico em metais cunhados faltarão os gêneros de primeira necessidade. Estranha riqueza aquela que, por maior que seja, não impede que seu possuidor morra de fome — como aquele Midas da fábula, cujo desejo cúpido transformava em ouro todas as iguarias que lhe eram servidas”.

No tempo em que viveu esse filósofo (séc. IV a.C.), só havia moedas de metal que, dependendo do material com que eram confeccionadas, ainda tinham algum valor intrínseco. O que diria ele das “papeladas” que circulam hoje pelas bolsas do mundo, ou dos papéis-moeda sem nenhum lastro?

É importante ressaltar aqui: se os governantes brasileiros tivessem aplicado as propostas de apoio à agricultura sugeridas há décadas pelo Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, o Brasil estaria hoje entre as primeiras nações do mundo. Os especialistas apontam que o saldo do agronegócio brasileiro na primeira década do século XXI ultrapassará 400 bilhões de dólares. Não fosse o déficit de outros setores, teríamos hoje o dobro de nossas atuais reservas internacionais.

A senadora e hoje presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), Kátia Abreu, denunciou recentemente que, dos 200 bilhões de reais do “pacote” anticrise do governo, apenas 8% foram destinados para a agropecuária. A quase totalidade desse montante foi aplicada, tendo em vista salvar bancos, montadoras de veículos e empresas de construção civil.

O que será das cidades sem o agronegócio?

Três irmãos goianos, Joesley Batista, José Batista Jr. e Wesley Batista, com seu esforço, tornaram-se donos da maior rede de frigoríficos –– JBS-Friboi, a maior empresa de carne bovina do mundo. Estes e outros brasileiros empreendedores são paradigmas da realização de bons negócios, tendo chegado neste âmbito ao topo da pirâmide. Devemos ainda fazer justiça a milhões de outros produtores rurais, que no anonimato de suas propriedades grandes, médias ou pequenas trabalham de sol a sol para o engrandecimento do País. Não obstante o Estado brasileiro tornar-se cada vez mais onipresente, açambarcador e coercitivo, a iniciativa privada deslancha.

O deputado Valdir Colatto, de Santa Catarina, afirmou que a fracassada Reforma Agrária –– cujos beneficiários vivem de cesta básica, com a promessa de bolsa-família e sem exigência de qualquer índice de produtividade –– custou aos cofres públicos cerca de 70 bilhões de reais, provenientes de impostos pagos pelos contribuintes.

Acabo de chegar do Mato Grosso do Sul, onde constatei mais uma vez o fracasso dessa reforma, numa reportagem publicada pelo jornal “Correio do Estado”, de Campo Grande. A reportagem atesta o descalabro que atingiu o antigo eldorado, que era a Fazenda Itamaraty do ex-rei da soja Olacyr de Morais. O assentamento está liquidado, e os assentados estão abandonando os lotes. É oportuno lembrar a propósito uma frase de Benjamin Franklin: “Se destruírem as cidades, mas conservarem os campos, as cidades ressurgirão; mas se destruírem os campos e preservarem as cidades, as cidades perecerão”.

O perigo da “oligarquia dos pardais”

O pardal é um passarinho de cidade. Parece que ele é “socialista”: preguiçoso, vive em bandos, faz muito barulho, come os ovos de outros pássaros, botando seus ovos no lugar dos de outras aves. No território ocupado por pardais, não há perigo de oposição, pois só nascerão pardais...

Assim também age o PT, uma espécie de “pardal” da política. Nascido na penumbra de certas sacristias, ele só medra nas cidades, junto das grandes indústrias e dos bancos. À maneira do pardal, que come os ovos dos demais passarinhos, o PT quer dominar inteiramente a situação. Governa com uma “base alienada” e se defronta com uma oposição que mais propriamente poderia chamar-se “composição”...

Se o povo brasileiro não se opuser com determinação às políticas do tipo “pardal” desenvolvidas pelo PT –– indigenismo, quilombolismo, ambientalismo, MST, combate a um pretenso escravagismo, entre outras — e o povo brasileiro não se lhes opuser com determinação, elas acabarão por dizimar e “engessar” nossos campos. E quando as cidades tiverem fatalmente descambado para o caos e vierem a miséria e a fome, possivelmente também chegará a seu fim a “oligarquia dos pardais”. Mas então será tarde demais para se restaurar a normalidade e a ordem.

Que Nossa Senhora Aparecida, Rainha e Padroeira do Brasil, nos livre e guarde!

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* Aristóteles, A Política, Livro primeiro, cap. 1, parág. 16, tradução de Nestor Silveira Chaves, Edições de Ouro, Rio de Janeiro, 1965.

Veja:
http://www.catolicismo.com.br/

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