O teste atômico da Coréia do Norte:


16/11/2006

Renato Murta de Vasconcelos
Correspondente
Espanha

Aumentou muito a intranqüilidade que paira sobre o mundo, ao se constatar a transformação da Coréia do Norte num bazar de armas nucleares, à disposição de grupos terroristas internacionais.


Kim Jong-Il

Madrid — 9 de outubro de 2006. Dia histórico para a Coréia do Norte. Enfrentando forte oposição dos EUA, Japão, Coréia do Sul e China, ela realizou neste dia seu primeiro teste nuclear ao explodir subterraneamente uma bomba atômica.

O fato preocupa especialmente por ser aquele país um dos últimos regimes comunistas do mundo de cunho estalinista, sob o férreo comando de Kim Jong-Il, um ditador excêntrico e inescrupuloso, do qual se podem temer as piores aventuras.

À testa de um gigantesco exército de mais de 1.100.000 homens,(1) Jong-Il saudou o teste como um grande acontecimento histórico. Opinião compartilhada pelo grande público norte-coreano? Não se sabe. O “amado líder”,(2) como se faz chamar, impõe despoticamente seu poder ao país, no qual a perseguição religiosa e o patrulhamento ideológico impedem qualquer oposição ou crítica, e onde o gigantismo estatal e a inoperância burocrática produzem uma espantosa miséria e fome.

Como se chegou a tudo isso?

A península da Coréia, que confina em grande parte com a China — possui também 17 km de fronteira com a Rússia — foi dominada pelos japoneses de 1910 até o final da Segunda Guerra Mundial. Com a derrota do Eixo, as potências vencedoras dividiram a península em duas zonas de ocupação. A região ao sul do paralelo 38 foi ocupada pelas tropas americanas e a do norte pelo exército vermelho.

Sob o bafejo da Rússia e da China começaram imediatamente os preparativos para a instalação de um regime de inspiração comunista ao norte. Uma das medidas consistiu em fomentar, a partir do fim de 1945, uma forte onda migratória de coreanos comunistas residentes na União Soviética. Outra foi a fundação do Bureau Norte-Coreano do Partido Comunista sob a presidência de Kim il-Sung.

Eram inequívocos os sinais de uma próxima instalação da ditadura comunista. O que provocou sérios protestos, sobretudo de estudantes. Tais reações foram contudo esmagadas de modo violento e praticamente definitivo. Pari passu, os comunistas do norte fomentavam movimentos subversivos e guerrilheiros no sul.

Regime de miséria comunista


O ditador Kim il-Sung

A República da Coréia do Norte foi fundada no dia 8 de outubro de 1947, e a do Sul três semanas antes, no dia 15 de setembro. Dividida a península em dois países, a Coréia do Norte tentou abocanhar a Coréia do Sul. Em 1950, num primeiro avanço, as tropas comunistas do norte conquistaram boa parte do sul. Entretanto, não conseguiram se estabelecer. Os comunistas tiveram que recuar, de um lado porque não alcançaram apoio da população civil; de outro, porque as tropas sul-coreanas receberam apoio do exército norte-americano. A China interveio a favor da Coréia do Norte e a Guerra da Coréia acabou transformando-se num conflito sino-americano, encerrado apenas em 1953 com o tratado de Panmunjon, que manteve praticamente as fronteiras anteriormente estabelecidas.

Desde então, repetiu-se na Coréia o que se viu no pós-guerra no mundo inteiro. Enquanto as nações livres que se envolveram no conflito mundial curavam suas feridas, desenvolviam-se e prosperavam de modo estupendo, como a Alemanha ocidental; os países subjugados pelo comunismo — esse regime antinatural, como apostrofou Pio XI em sua encíclica Divini Redemptoris — caíam no marasmo, na estagnação, e rolaram até a pobreza extrema.(3)

A Coréia do Sul desenvolveu sua economia a passos de gigante, transformando-se numa grande exportadora de bens de consumo. Na Coréia do Norte, pelo contrário, a estagnação produziu uma escassez que custou, somente na década de 90, mais de 2,5 milhões de vidas, ou seja, pouco mais de um décimo da população.

Uma dinastia de ditadores marxistas

O ditador Kim il-Sung morreu em 1994 depois de quase 50 anos de poder absoluto, “endeusado” pelos camaradas do Partido dos Trabalhadores, após ter silenciado toda e qualquer oposição e criado um ciclópico aparato militar. Depois de três anos de “luto”, foi sucedido por seu filho Kim Jong-Il, tido como extremamente matreiro e voluntarioso. A vaidade de Jong-Il, 62 anos, também não conhece limites. Querendo parecer mais alto do que é — ele mede 1,62 m — além de usar sapatos com sola desmesuradamente grossa, levanta e engoma o topete de seu cabelo. Do pai herdou também o “culto pessoal”. Provavelmente nascido nas trincheiras, quando seu pai era guerrilheiro, a máquina de propaganda governamental difunde que teria nascido na “montanha sagrada” Paekdu, e que no dia de seu nascimento teriam ocorrido fatos extraordinários. É uma figura tragicômica, cognominado de o “o grande sol da nação”, considerado um “gênio do terrorismo”, líder de um regime brutal. Enquanto chefe nos anos 70 e 80 das Tropas Especiais, foi responsável por diversos atentados, entre outros o ataque ao jato da Korean Airlines, cuja derrubada custou 115 vidas humanas.

Jong-Il, um paranóico ou um ator que se esconde atrás da máscara da loucura para ocultar suas intenções e manter o mundo em estado de suspense?

O chefe do PT da Coréia

Indiferente a essa imensa tragédia, o ditador vitalício Kim il-Sung, o homem escolhido por Moscou para dirigir a Coréia do Norte nas sendas do comunismo, desde junho de 1949 chefe do Partido dos Trabalhadores da Coréia (PTC), e agora chamado de “o grande líder”, levou o país a um isolamento cada vez maior. A par de seu engessamento doutrinário nos velhos dogmas do comunismo, procurou esconder da população os êxitos econômicos da Coréia do Sul. Com o desmoronamento do comunismo nos países do Leste Europeu, tal isolamento não fez senão aumentar.

Kim il-Sung morreu em 1994. Sucedeu-o, na chefia do Partido Comunista, seu filho, o “amado líder” Kim Jong-Il, o atual “grande sol da nação” e responsável pelo teste nuclear do mês passado.

O teste constitui um desafio aberto aos apelos do presidente dos EUA, do secretário-geral da ONU, do primeiro-ministro do Japão. Em retaliação, o Japão fechou os portos e proibiu a importação de produtos da Coréia do Norte. A China limitou-se inicialmente a repreensões verbais; agora considera a possibilidade de construir uma muralha ao longo de sua fronteira com a Coréia do Norte. Não se sabe bem com que sinceridade, pois a China é tida e havida como a grande mentora da Coréia do Norte. A Coréia do Sul, a mais gravemente ameaçada pelo eventual poderio nuclear do norte, cancelou tratados de cooperação econômica.

Terrorismo internacional

Resultado inequívoco da ladina e ousada manobra de Jong-Il — dir-se-ia um ato de loucura, no qual entretanto há método — é desprestigiar os Estados Unidos e transformar o Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares em mero pedaço de papel. De outro lado confirma o fracasso estrondoso da política “ensolarada” da Coréia do Sul de aproximação com o Norte. Evidentemente fomentará na região uma corrida armamentista. Tanto a Coréia do Sul quanto o Japão procurarão obter o mais rápido possível o acesso a armas de dissuasão nuclear.

E outro perigo ainda fica pairando no ar: doravante a Coréia do Norte pode se transformar num bazar de armas nucleares, no qual grupos terroristas internacionais e a máfia do crime organizado adquiram armas nucleares a seu bel prazer, tendo assim em suas mãos um elemento de chantagem de poder incalculável.

9 de outubro de 2006. Dia histórico para a Coréia do Norte comunista. E para o resto do mundo também...

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Notas:

1. Em proporção à população de 23 milhões de habitantes, o exército da Coréia do Norte talvez seja o maior do mundo, seguido de perto pelo cubano.

2. Em alemão se diz “der beliebte führer”. Doutrina, modos de ser, métodos de ação do nazismo, sob o comando do führer Hitler não diferiam muito dos empregados hoje pelo führer Jong-Il.

3. Triste exemplo disso na América Latina é Cuba, onde o salário de um professor não passa de 35 reais, o de um médico 55 e o de um motorista de táxi 22. É proporcional a esses valores a minguada bolsa-família de 50 reais concedida pelo governo brasileiro a famílias pobres especialmente do Nordeste.

Veja:
http://www.catolicismo.com.br/

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